Pobreza, o desafio maior das UPPs
Pesquisa realizada pelo Ibope junto a jovens de sete favelas pacificadas mostra que a pobreza supera o tráfico e a violência, juntos, como problemas a serem enfrentados. A prefeitura vai remover os 20 barracos da Favela da Matinha, vizinha à Rocinha, todos construídos em área de risco.
Para jovens de favelas com UPP, baixa renda é pior que tráfico, desemprego e violência
Isabel de Araujo isabel.araujo@oglobo.com.br
Em tempos em que o poder público e a população comemoram a retomada de territórios controlados há décadas pelo tráfico, uma pesquisa encomendada pela Secretaria estadual de Assistência Social e Direitos Humanos mostra que o maior inimigo dos moradores de favelas pacificadas está longe de ser vencido. Na opinião de 700 jovens residentes em sete comunidades que receberam Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), a pobreza ainda representa o maior obstáculo em suas rotinas. O problema foi citado por 24% dos entrevistados e ficou na frente, inclusive, do desemprego (10%), do tráfico de drogas (10%) e da violência (8%). O estudo foi coordenado pela Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso), em parceria com a Uerj.
Os dados foram colhidos pelo Ibope nos últimos quatro meses. Os 700 jovens, com idades entre 15 e 29 anos, responderam a um questionário para mostrar quais são as necessidades atuais para uma vida segura e de boa qualidade em comunidades com UPP. As favelas escolhidas por sorteio foram Providência (Centro), São João (Engenho Novo), Pavão-Pavãozinho/Cantagalo (Copacabana), Turano (Rio Comprido), Andaraí, Macacos (Vila Isabel) e Batam (Realengo).
Maioria não quer deixar comunidades
O estudo faz parte de uma parceria entre o governo do estado e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), para traçar programas específicos para a juventude de áreas carentes. O resultado será apresentado em janeiro. Como noticiou Ancelmo Gois em sua coluna no GLOBO, a pesquisa mostra que 70% dos jovens não querem deixar suas comunidades e aguardam melhorias. Apenas 29% querem sair das favelas, sendo que, desse total, 65% pretendem continuar no Rio, mas no asfalto. Um por cento dos entrevistados não respondeu ou não soube responder a esse quesito.
— O acordo com o BID foi firmado há oito meses. O banco entrará com R$90 milhões e ao governo do estado caberá a contrapartida de R$35 milhões. Já criamos o Comitê Executivo de Políticas Sociais Para Áreas Pacificadas. Nosso foco são os jovens de áreas que receberam UPPs. Queremos saber quais são as expectativas deles e traçar programas que atendam a esses anseios — disse o secretário de Assistência Social, Rodrigo Neves.
A professora Miriam Abramovay, responsável pela elaboração dos questionários, disse que foram encontradas “famílias extremamente pobres”:
— Cinquenta por cento delas têm uma renda média de um a dois salários mínimos. São famílias com quatro ou mais pessoas que vivem com menos de mil reais por mês.
Ela lembra que, embora a violência tenha ficado em quarto lugar na lista de problemas, quando a pergunta foi quais as principais ações para melhorar as condições de vida nas favelas, o combate à violência ficou no topo.
— Ainda estamos finalizando o levantamento qualitativo, no qual os jovens comentam as questões. Eles citam a polícia violenta, a violência entre vizinhos, a proibição de baile funk… Todos problemas relacionados à violência — disse a professora.
Outro ponto que chama a atenção é referente à ocupação dos jovens. Do total de 700 entrevistados, 44% só trabalham e 19% só estudam; 26% não fazem nem uma coisa nem outra. No quesito evasão escolar, 55% disseram ter interrompido os estudos.
— Entre os 55% que pararam de estudar, 41% disseram que os motivos foram falta de tempo e necessidade de trabalhar. Em segundo lugar ficou a gravidez, com 29%. Em terceiro, aparece cansaço da vida ou desânimo com o colégio.
A pesquisadora disse que ficou impressionada também com a quantidade de jovens que não conseguiam preencher o questionário, por não saber ler. A pesquisa, contudo, identificou apenas 2% de analfabetos. A grande maioria (31%) disse ter concluído o ensino fundamental. Apenas 1% declarou ter concluído o ensino superior. O questionário é concluído com uma pergunta sobre planos para o futuro e uma surpresa: 34% dos jovens sonham cursar uma universidade.
Jovens devem ganhar bolsas para estudar
Com base na pesquisa, entre os principais projetos a serem implantados, segundo o secretário Rodrigo Neves, está o programa de tutor, para acompanhar jovens que tiverem passagem pela polícia:
— Ainda estamos estudando como seria feito esse acompanhamento, mas seria uma forma de dar uma direção a esses jovens, estimulá-los a retornar aos estudos e capacitá-los para o mercado de trabalho.
Outra iniciativa é a criação de bolsas-poupanças, nos valores de R$3.100 a R$4.200 — concedidas pelo período de três anos —, a jovens que se mantiverem nas salas de aula.
— Seria concedido o benefício a famílias muito pobres, com renda abaixo de um salário mínimo, e que teriam de estar cadastradas na prefeitura para o Bolsa Cidadão — frisou o o secretário.
Comentários