A esquerda latino-americana tem hoje “mais votos do que ideias” e isso contribui para que o conservadorismo ainda predomine no debate público, disse Marco Aurélio Garcia, assessor internacional do Planalto.
O fenômeno, segundo ele, seria acentuado pelo fato de “muitos meios de comunicação” da região terem se “transformado em partidos políticos”.
“Tudo bem, mas, da mesma forma que sou contra o partido único, sou pela pluralidade [da informação]”, disse, em evento na terça-feira (16) sobre integração regional promovido no Rio pela Flacso (Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais).
Garcia mencionou que a Flacso, criada nos anos 50 por sugestão da Unesco (órgão da ONU para educação e cultura), teve papel importante no passado, e pediu que os colegas retomem uma “ofensiva mais forte no debate intelectual”.
“Nós temos que ajustar a reflexão do pensamento social latino-americano às mudanças que estão ocorrendo, e que estão indo mais rápidas do que a reflexão.”
Deu como exemplo temas relativos à segurança coletiva (defesa regional) e ao crime organizado. “Temos que construir respostas para questões sobre as quais só os conservadores dão sua contribuição.”
No caso do Brasil, Garcia disse que o “restabelecimento da ideia de mobilidade social” foi “importantíssimo”, mas defendeu medidas que aumentem o acesso à educação e à cultura da população que sai da pobreza.
“Precisamos que setores que estão ascendendo tenham outras referências de cultura política, do contrário não se pode falar em democratização da sociedade.”
Questionado se temia que a classe C se torne conservadora politicamente, respondeu: “Não estou preocupado com que se torne conservadora, mas que tenha acesso aos bens culturais de hoje, assim como tem ao tênis Reebok”.
Garcia disse que ainda não sabe se continuará no governo e que terá uma reunião com a presidente eleita Dilma Rousseff na próxima semana.
Sobre os nomes citados como possíveis substitutos do chanceler Celso Amorim, incluindo os de Nelson Jobim (Defesa) e Antonio Palocci (ex da Fazenda), disse que são “boatos” de “quem não tem assunto”.
“Todos têm perfeitas condições de serem ministros, por que não?”
O assessor do Planalto afirmou que a América do Sul tem potencial para ser polo importante no mundo “multicêntrico”, dados seus recursos naturais e “imateriais”, como o fato de ser “zona de paz e de regimes democráticos”.
Mas disse que é preciso “institucionalizar” a integração, passando “da retórica a iniciativas concretas” em energia, infraestrutura e coordenação política.
Segundo ele, essa tarefa é facilitada pelo fato de todos os governos sul-americanos, independentemente de seu signo político, terem concluído que a integração é importante. “Todos os que tentaram encontrar fora da região respostas para seus problemas não encontraram”, disse, numa referência indireta às dificuldades enfrentadas por países como México e Colômbia em seus acordos de livre comércio com os EUA.
O evento teve a presença de diretores da Flacso em 12 países latino-americanos, incluindo Brasil (Pablo Gentili), México (Francisco Valdés) e Equador (Adrián Bonilla). Foi assinado um convênio de cooperação com o Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) para o futuro financiamento de projetos de pesquisa sobre desenvolvimento regional.
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