São Paulo – O Conselho Nacional de Educação, ligado ao Ministério da Educação (MEC), vai estabelecer diretrizes nacionais para a oferta de ensino profissional para os jovens que cumprem medida socioeducativa em regime de internação. O órgão elabora, desde a última semana, uma série de normas para a educação de adolescentes em conflito com a lei, em documento que será entregue ao ministro da Educação, Henrique Paim, nos próximos meses.
“Poucos lugares se preocupam com a dimensão profissionalizante e esse é um dos maiores defeitos. Não há tempo de pensar esses meninos no mundo do trabalho, até porque o ambiente é tenso e o esforço principal é o de oferecer aprendizado semelhante ao da escola pública. É uma lacuna brasileira”, avalia o presidente da comissão responsável pela elaboração das diretrizes, Luiz Roberto Alves.
Como mostrou reportagem da RBA, o acesso à educação profissional e superior dos jovens em medida socioeducativa ainda é bastante restrito, mesmo em São Paulo, estado com a maior estrutura para oferta do serviço no país. Falta incentivo e sobra resistência do Poder Judiciário em adotar estratégias que permitam aos jovens frequentar as aulas em escolas convencionais.
Neste ano, apenas 19 dos nove mil internos de São Paulo conseguiram uma vaga nas Escolas Técnicas Estaduais (Etecs) ou nas Faculdades de Tecnologia do Estado (Fatecs). Dos 612 adolescentes internos na Fundação Casa que realizaram o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) do último ano, apenas nove conseguiram uma vaga em universidades pelo Sistema de Seleção Unificada (Sisu) ou pelo Programa Universidade para Todos (ProUni).
Agenda urgente
A primeira reunião para elaboração das diretrizes nacionais, realizada na última semana, em Brasília, contou com a participação de representantes do Secretaria Especial dos Direitos Humanos, do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, do Ministério da Educação e do Conselho Nacional de Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda). Além disso, participaram representantes dos governos de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Maranhão, Rio Grande do Sul e Paraná.
Outra prioridade das diretrizes nacionais para educação de jovens em medida socioeducativa será avaliar especificamente a qualidade do ensino oferecido para os internos, o que não é feito no país. Além disso, o documento deve determinar normas para organizar o espaço das aulas, garantindo infraestrutura mínima, e para formação específica dos professores que trabalham nessas unidades.
“Nunca houve diretrizes nacionais nesse campo, só há modos de trabalho estaduais. Cada um faz conforme sua experiência e seu sistema educacional”, diz Luiz Roberto. “Os estados relataram o que fazem e o conselho não julga esses relatos. Mas eles indicam uma diversidade que precisa ser retrabalhada. A diversidade mostra pontos positivos e negativos, defeitos e virtudes.”
As diretrizes terão como foco os adolescentes que cumprem medida socioeducativa em regime de internação, uma vez que o conselho de educação entendo que os que estão em liberdade assistida conseguem ter um ensino de mais qualidade, já que saem das unidades para estudar em escolas convencionais.
Em 2010 o número de jovens em medida socioeducativa era de 17.703, segundo estudo da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. Pelo levantamento, 12.041 deles estavam internados, 3.934 em internação provisória e 1.728 em medida de semiliberdade.
A maioria dos jovens em conflito com a lei apresenta elevada distorção série-idade. Ao todo, 57% dos adolescentes encaminhados que cumpriam medida socioeducativa no país em 2012 não frequentavam a escola, segundo uma pesquisa do Conselho Nacional de Justiça. Embora a idade média dos internos seja de 16,7 anos, a última série cursada por 86% deles ainda era do ensino fundamental, o que significa que a maioria não concluiu a etapa obrigatória da educação, segundo a pesquisa.
“A formação continuada dos professores precisa ser melhor. Além disso, vamos fazer visitas a unidades. Eu não tenho dúvidas que há espaços precários, em quantidade e qualidade”, diz Luiz Roberto. “Precisamos pensar nos lugares educacionais que se oferece, na formação de professores e no currículo escolar. Existe muita desigualdade nesse processo.”
A comissão que vai elaborar as diretrizes se reúne uma vez por mês. No próximo encontro, marcado para 1º de abril, os conselheiros vão avaliar a primeira reunião e planejar as próximas ações. Na edição de maio devem ser convidados o Conselho Nacional de Justiça, promotorias de estados e novamente o Conanda.
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