A cena ainda é comum: perto das 22h, diversos ônibus fretados aguardam os estudantes da Universidade Católica de Pernambuco, no Centro do Recife, saírem das aulas. Os coletivos vêm de cidades do Interior. Cena parecida acontece na Universidade Estácio de Sá – Fir, no bairro do Prado, na Zona Oeste. Essa realidade encontrou uma mudança com o crescimento da oferta de cursos a distância que vem democratizado o acesso ao ensino superior, como demonstra um relatório elaborado pela Associação Brasileira de Ensino a Distância (Abed) e o Instituto Nacional de Estudo e Pesquisas Educacionais (Inep). Em 2011 foram 992.927 mil de matrículas, o que representa 14,6% dos ingressos do ensino superior.
O ensino a distância vem sendo uma alternativa para cidades do Interior do Estado sem faculdades públicas ou privadas. Antes, grande contigente de jovens se mudavam para a capital para morar em repúblicas. Mais recentemente, a melhor opção é mesmo encarar a estrada. No ensino a distância a praticidade e a economia gerada parece ter vendido o receio que muitos tinham em um passado recente, de que se tratava de ensino de baixa qualidade. “Muitos pensam que EAD é mais fácil em relação a uma gradução com aulas presenciais, mas é justamente o contrário. O aluno precisa mostrar mais interesse, mais dedicação para poder acompanhar o conteúdo”, explica Fernanda Bittencourt, diretora da área de ensino a distância da Universidade Estácio de Sá – FIR.
No ensino online, o estudante faz o próprio horário. As aulas podem ser gravadas ou transmitidas ao vivo. A maior parte das instituições mantém tutores para ajudar os alunos nas dúvidas e também para facilitar o vínculo com a universidade e evitar a alienação. Há também fóruns de discussão das disciplinas. “Esse ensino requer um comportamento mais autônomo do estudante. Digo que são necessárias 10 a 12 horas de estudo por semana para cursar de maneira satisfatória”, explica. Na Estácio, Pernambuco possui a maior base de alunos de ensino a distância, atrás apenas do Ceará. “Verificamos um movimento cada vez maior de estudantes presenciais do interior, que assistiam aulas em nossa unidade do Recife, e que agora fazem EAD em seus municípios”.
Hoje 70% dos estudantes de ensino a distância estudam e trabalham, segundo o último censo da Abed. Em sua maioria são mulheres, entram na faculdade mais tarde (aos 28 anos, contra 24 do presencial) e procuram cursos de pedagogia e administração.
Um diploma de Noronha
Antes de se mudar para Fernando de Noronha Patrícia Roelandt queria ser atriz. Mudou-se para acompanhar o marido e deixou para trás um curso de comunicação incompleto e uma peça de teatro já na fase de montagem. Hoje, aos 40 anos, ela acaba de se formar em marketing através de um curso a distância. “Estava decepcionada por não ter um diploma, depois de tanto trabalho. Mas, não queria ter de morar no Recife para ter um curso superior”, diz.
Com a graduação online, Patrícia precisou vencer adversidades da Fernando de Noronha, entre elas a péssima conexão de internet. A maior parte dos estudos foram feitos nos computadores do departamento de turismo do arquipélago, onde atua como coordenadora de ecoturismo. “O estudo a distância só vale a pena se existir dedicação, senão terá apenas um diploma. Já busco pós-graduação e oriento minha filha sobre as vantagens para quando chegar a idade de fazer faculdade”.
Já o gerente administrativo Melqui Ferreira, 28 anos, optou por fazer um curso a distância por não encontrar em sua cidade, Surubim, no Agreste do Estado, o curso que desejava. “Não quis encarar a viagem longa para o Recife. E aqui a faculdade mais próxima fica em Nazaré da Mata, mas por lá o foco é nas licenciaturas”, diz. Melqui cursa gestão de recursos humanos e pensa em cursar outra graduação assim que terminar. “Pode ser a distância ou presencial”.
Ensino a distância promove cidadania, diz organização
No ano passado foi realizado no Recife o IX Congresso Brasileiro de Educação Superior a Distância. No evento foi elaborada a “Carta do Recife”, um documento que sintetizou as demandas do setor e a importância da modalidade para a democratização do acesso à universidade. Entre os tópicos estão: cobrança de subsídios do governo para pesquisas, mais apoio para criação de novos cursos e promoção da discussão sobre a cidadania atrelada ao ensino a distância.
O documento foi uma iniciativa da UniRede, uma rede de instituições públicas do ensino superior voltadas para a EAD. Segundo o censo da Abed, hoje a maioria das matrículas acontecem em instituições privadas. São 60,5% em faculdades com fins lucrativos e 14,5% em instituições filantrópicas. As universidades públicas ficam apenas com 15% do total, sendo 8% em federais e 7% em públicas estaduais.
O número é baixo quando comparado com países onde o ensino a distância já está estabelecido, como é o caso dos EUA, Alemanha e Canadá. No ano passado, das 56 universidades canadenses, 53 possuíam cursos a distância. As respeitadas instituições norte-americanas Harvard, Princenton, Berkeley e Stanford oferecem cursos para alunos do mundo inteiro. “O EAD para um país de tamanho continental como o nosso é imprescindível”, disse Alex Sandro Gomes, professor do Centro de Informática da Universidade Federal de Pernambuco. Ele é o coordenador da Associação Brasileira de Educação a Distância em Pernambuco e um dos nomes atuantes na democratização dos cursos online aqui no Estado. “A penetração da internet em cidades do Interior vem facilitando esse acesso aos cursos. Estamos trabalhando em parceria com o MEC e órgãos que lidam com formação para melhorar ainda mais o acesso”.
Comentários