fbpx

Seja na preocupação dos empresários com a disponibilidade de mão de obra qualificada para a sustentação dos negócios ou nas centenas de iniciativas governamentais, a Educação hoje perpassa praticamente todas as grandes agendas do Brasil.

A despeito da importância do setor e do progresso visto nos últimos 20 anos, como a universalização da Educação básica ou a expansão do Ensino superior, uma sensação incômoda persiste no cotidiano de quem está diretamente envolvido com as políticas educacionais brasileiras: melhorias em termos de qualidade são excessivamente lentas.

O ritmo desses avanços acaba virando um grande problema de médio e longo prazos, pois joga contra o atual esforço de elevar o crescimento econômico e interfere diretamente no modelo de desenvolvimento pensado para o país.

Na opinião do Professor Romualdo Portela, da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), a lentidão dos avanços da qualidade do Ensino pode ter raiz na ausência de prioridades atribuída ao setor na formulação dos planos estratégicos de desenvolvimento do país.

Estudioso da inserção da Educação nos instrumentos de planejamento de Estado, Portela explica que o país vive um dilema, como pretende demonstrar no livro “Desafios da Educação para o Desenvolvimento Brasileiro”, que será publicado em breve pela Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (Unesco).

“O Ensino aparece como componente fundamental do processo de desenvolvimento e de crescimento desde o Plano de Metas do Juscelino [Kubitschek, 1902-1976] nos anos 1950, mas isso nunca se desdobra em uma clara priorização de investimento na área como materialização dessa prioridade”, avalia o acadêmico. “O desenvolvimento não é parte estruturante da agenda educacional, ainda que a expansão da Educação com qualidade represente aporte significativo aos projetos de desenvolvimento”, complementa Portela.

O descompasso entre as prioridades do Ensino estabelecidas nos planos estratégicos de desenvolvimento e sua efetiva realização é visível nas políticas educacionais atuais mais importantes, que se arrastam ou sofrem terrível dificuldade para serem colocadas em prática. Exemplos disso são o Plano Nacional de Educação (PNE), a indefinição sobre o investimento das receitas do pré-sal no Ensino e o pagamento do piso nacional dos Professores.

Legislação que cria diretrizes nacionais para a Educação no período de uma década, a primeira edição do PNE, que vigorou entre 2001 e 2010, foi inócua. Já o PNE 2 está parado no Congresso desde dezembro de 2010, sem perspectivas de aprovação. Na semana passada, o Congresso Nacional, orientado pelo governo federal, ignorou o capítulo da nova lei de distribuição dos royalties de petróleo que trata da aplicação dos recursos em manutenção e desenvolvimento do Ensino – a decisão agora cabe ao Supremo Tribunal Federal (STF). Com relação à lei que desde 2008 obriga Estados e municípios a pagar um piso a seus Docentes, centenas de prefeituras e governos estaduais burlam a legislação e pagam salários inferiores a R$ 1.500.

“Esses exemplos mostram que, no discurso, governadores e prefeitos colocam Educação como prioridade, mas criam uma série de obstáculos quando surgem medidas concretas que podem trazer algum resultado num ritmo interessante. É a retórica vencendo a prática”, critica Portela.

Em suas andanças pelo país, o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, tenta passar uma visão diferente, de que Educação é prioridade tanto do governo Dilma Rousseff como do Estado brasileiro. Em suas palestras e entrevistas, Mercadante não se cansa de afirmar que o MEC enxerga o setor como prioritário para o crescimento sustentável do país. “Como há muito tempo não se via, desenvolvemos uma visão sistêmica da Educação, investimos com a mesma prioridade da Creche à pós-graduação. O orçamento do MEC mais que quadruplicou nos últimos dez anos, vamos investir mais de R$ 6 bilhões dentro do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), trabalhamos para ter os recursos do pré-sal visando ao desenvolvimento futuro e temos um importante papel na política econômica que vem sendo executada pelo governo federal no período pós-crise”, disse Mercadante em entrevista ao Valor no fim do ano passado.

Outros especialistas ouvidos pela reportagem destacam as experiências dos últimos 50 anos de Coreia do Sul, China, Austrália e Chile como referências para avanços considerados rápidos na qualidade do Ensino. Uma das razões para isso é que nesses países a política educacional está intimamente associada a um planejamento de desenvolvimento de nação. O caso mais estudado é o da Coreia do Sul, que registrou o mais rápido avanço em qualidade da Educação e vários indicadores sociais, num processo que começou nos anos 1940 e continua até hoje, com o país no topo dos rankings de Ensino e de desenvolvimento humano.

Sung-Sang Yoo, Professor da Hankuk University of Foreign Studies, da Coreia do Sul, e pesquisador da University of California (Ucla), conta que a receita para o salto educacional da Coreia ocorre a partir de um ponto de vista “simples”: “Prioridade governamental e planejamento de longo prazo”, diz. Segundo Yoo, o governo coreano aproveitou oportunidades do pós-guerra e apoios multilaterais para traçar um plano de desenvolvimento estratégico que conjugasse crescimento econômico junto com avanço educacional, de forma conceitual e pragmática.

“Em dez anos foi uma avalanche de medidas. Com elas, as conquistas vieram rapidamente: universalização da Educação básica chegou em menos de dez anos, ainda nos anos 1950; Professores passaram a ter os melhores salários do mercado; o governo central aumentou expressivamente os gastos com Educação. Tudo isso foi um ponto de partida importantíssimo para definir os rumos da economia coreana, baseada numa indústria forte e inovadora”, explica Yoo.

Ele acrescenta que, mesmo hoje, as políticas educacionais continuam liderando as prioridades de Estado. “A mais nova ambição do governo é transformar a Coreia no primeiro país a universalizar o Ensino superior”. Hoje, 65% dos coreanos de 25 a 34 anos têm diploma universitário, o maior índice do mundo; no Brasil, essa taxa não ultrapassa 15%.

Na avaliação da consultora em Educação Ilona Becskeházy, para o Brasil avançar mais rapidamente na qualidade do Ensino são necessárias decisões mais simples, não necessariamente associadas a grandes planejamentos estratégicos. Decisões simples, diz ela, é dar padrão às políticas educacionais mais estruturais, principalmente aquelas relacionadas ao conteúdo pedagógico e à formação de Professores. “É preciso definir parâmetros de qualidade e como esses parâmetros serão alcançados. Não há no Brasil um currículo nacional, não sabemos bem o que a criança precisa aprender em cada série e em cada disciplina”. Sem a adoção de parâmetros o país nunca dará os saltos “que precisamos”.