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Em 21 de outubro do ano passado, o pedreiro Cícero Amorim Pereira, 58 anos, era um homem vivo. De madrugada, começou a sentir os sintomas de um Acidente Vascular Cerebral (AVC).

Mesmo tonto, levantou-se para ir ao banheiro. À companheira, relatou uma dormência no braço. Em minutos, mal conseguia falar. Caiu desmaiado no meio da casa. Não acordou no dia seguinte. E nem nunca mais. Dez meses depois, em 23 de agosto deste ano, era um homem morto.

Hoje, Dia de Finados, fica o consolo de que Cícero lutou o quanto foi possível. O filho, o autônomo Marconi Pereira, 33 anos, se orgulha da batalha que ele travou contra a morte. “Não sei como aguentou tanto tempo em uma cama de hospital. Queria viver. Era um cara forte. Esse tal de AVC é miserável”, define. 
E é mesmo. No ranking dos males que mais tiram a vida dos baianos, as doenças cerebrovasculares, na sua maioria AVCs, aparecem em segundo lugar.      

O dado consta na Lista Brasileira para a Mortalidade, baseada em levantamento da Secretaria Estadual da Saúde (Sesab), encaminhado para o Datasus, onde estão indicados outros tantos responsáveis pelos nossos finados. Na ordem das cinco primeiras causas fatais, depois das doenças do cérebro (que mataram 6.275 pessoas em 2011), a Bahia morre também de homicídios (4.997), doenças isquêmicas do coração (4.492) e diabetes (4.349).  

Mas, e o primeiro lugar da lista? São as chamadas mortes sem assistência médica, quando a pessoa é encontrada morta e não há como definir o motivo. Essas causas misteriosas mataram 6.942 pessoas na Bahia no ano passado. Juntando todos os tipos de doenças e eventos que causaram mortes, um total de 77.912 pessoas nos deixou em 2011. 

Das causas de morte que são definidas, o cérebro mata mais do que tudo neste estado. Por isso, além de relacionar os AVCs a hipertensão, diabetes e  tabagismo – principais causas das doenças cerebrovasculares -, o neurocirurgião Luiz Soeiro aponta a falta de assistência básica como um agravante.

Ou seja, não é só culpa do sal e do açúcar. “Aqui, a população mais humilde não sabe que é hipertensa ou diabética. Isso é consequência da falta de acompanhamento primário. Geralmente, descobre quando tem o evento”, diz Soeiro.

Crimes 
Já a violência, do jeito que vem matando os baianos, é tratada pelos especialistas quase como uma doença. Na terceira posição, os homicídios são uma epidemia que se espalha em ritmo acelerado por aqui. No restante do país, são apenas a sétima causa de mortes.

Segundo o sociólogo Júlio Jacobo, responsável pela elaboração do Mapa da Violência no Brasil, do Ministério da Justiça, aqui, a média de assassinatos   por ano chega a quase 70 por cada 100 mil habitantes, o que   coloca a Bahia  na 4ª posição no país.

Jacobo observa que, assim como as enfermidades, os crimes migram de um lugar para o outro. “Alguns estados, como São Paulo, melhoraram seus aparelhos de segurança. O crime então migrou para o interior e outros estados”.

Coração
O coração dos baianos também têm perdido a força. O número de infartos agudos do miocárdio, responsáveis por 88,9% das mortes relacionadas com as chamadas doenças isquêmicas do coração, chega bem próximo do número de homicídios.

Seja por ateromatose (acúmulo de gordura) ou trombose (rompimento de placas de gordura), o coração deixa de ser alimentado com o que o faz bater, o sangue.

Acredita-se que metade dos infartos sequer dá a chance de a vítima chegar no hospital. “Muitas das mortes sem assistência médica têm, com certeza, causas cardíacas”, acredita a cardiologista do Hospital Santa Izabel Silvia Brandão. Por isso, é tão importante investir em serviços de emergência como o Samu.

“A existência de desfibriladores em locais públicos também pode salvar muitas vidas”, acredita Silvia. Mais até do que a relação com a herança genética, os infartos têm origem no desleixo alimentar e sendentarismo.

“O baiano faz pouco exercício e come muita besteira. Tem que fazer mais atividade física, monitorar o histórico de doença cardíaca na família, ingerir menos gordura saturada e fumar menos”, emenda.

Mas, há uma doença que, apesar de ter menos registros na lista de mortandade, talvez seja ainda mais perigosa que as outras. Até porque ela é a porta de entrada tanto dos AVCs quanto das doenças que atacam o coração. 

É a quarta colocada: o diabetes. “O paciente de diabetes tem uma grande tendência a desenvolver doenças cerebrais e isquemias do músculo cardíaco. Não é açucar alto que mata em si”, confirma a endocrinologista e professora de Fisiologia da Ufba Luciana Barros Oliveira.

Além do sedentarismo e da alimentação ruim, a subnotificação, reforça a médica, é um complicador muito forte. “Estima-se que há um número enorme de pessoas que nem sabe que é diabético. As pessoas têm que fazer exame de sangue”, recomenda Luciana.  Mas, por mais complicada que seja essa doença, existe alento. “Se descoberto e bem acompanhado, o paciente com diabetes pode ter uma vida bem próxima da vida comum”. 

Em suma, para as pessoas pararem de morrer desse jeito, a primeira coisa a se fazer é mudar os hábitos, a cultura da má alimentação e do sedentarismo.
“O estado e o país se debruçam hoje nas ações de promoção da saúde.

Incentivar a alimentação adequada, os exercícios, o bem-estar, são prioridades”, resume a diretora de informação da Secretaria Estadual da Saúde (Sesab), Márcia Mazzei, médica especialista em saúde pública.

Chama a atenção que, para diminuir os homicídios, a receita é a mesma: mudança de hábitos. O remédio para os assassinatos é combater a cultura da violência.

“Se para controlar a dengue deve-se criar um cerco ao mosquito, para barrar o crime deve-se primeiro criar cercos sanitários e depois erradicar focos como as organizações criminosas, os grupos de traficantes e a cultura da violência”, explica Julio Jacobo.

Portanto, neste dia de homenagem aos mortos, pense mais na sua vida. Proteja-se, cuide do seu corpo e vá ao médico. Viva mais e viva bem.