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O adolescente Paulo Nunes Alves, 17 anos, caminhava distraído, ouvindo música ao celular que havia ganhado não fazia muito tempo,quando teria sido abordado por dois homens numa moto que pretendiam roubar o aparelho. Paulo, no entanto, teria se negado a entregar o telefone e por isso recebeu um tiro fatal no peito. O crime que chocou o município de Abaetetuba ocorreu na rua Siqueira Mendes, bairro de Algodoal. A polícia diz já saber quem são os dos suspeitos.

Uma senhora que não quis se identificar alegou ter sido a primeira a chegar ao local do crime. “Eu ouvi um tiro e logo em seguida um grito bem alto. De primeiro cheguei a pensar que alguém tinha disparado um foguete e se ferido. Corri pra lá e quando cheguei encontrei o garoto jogado no chão de peito pra baixo”, relatou. Segundo ela, logo depois chegou um senhor que teria virado o corpo de Paulo enquanto o garoto dava os últimos suspiros, que não demoraram a cessar.

Paulo foi criado pelos avós na comunidade Moju-Miri, pertencente ao município de Abaetetuba. Há cerca de dois anos ele teria sido trazido para o centro da cidade para concluir os estudos, uma vez que na comunidade não há Ensino Médio. Alguns moradores chegaram a cogitar que o crime não teria sido por acaso, uma vez que os assassinos nem chegaram a levar o aparelho do adolescente após os disparos, mas professores, parentes e a própria polícia descartam essa hipótese.

“Paulo era um menino bom, brincalhão. Não tinha desavença com ninguém. Toda a comunidade escolar está de luto após mais esse crime brutalque acontece em nosso município”, desabafou Sandra Cristina, que foi professora dele na Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Terezinha de Jesus F. Lima. No portão da escola, um pano preto com mensagem de pesar demonstrava que a escola estava de luto.

Dentro do colégio, cartazes com mensagens de paz, revolta e saudade feitos por professores e alunos anunciavam o manifesto que foi preparado para hoje cobrando ação dos órgãos de segurança pública para que seja feita justiça e para que a matança no município tenha fim. O corpo de Paulo será velado no pátio da escola, depois será levado em cortejo até uma igreja católica aonde ele frequentava. Então, será sepultado no cemitério municipal da cidade.

No casebre aonde vive a mãe do adolescente, a dona de casa Maria Cristina, 34 anos, o corpo do adolescente foi velado por parentes e amigos mais próximos. A residência é localizada na alameda São Domingos, no bairro do Algodoal, considerado um dos mais empobrecidos de Abaetetuba. A mãe, que não teve o apoio do pai do garoto quando ele nasceu e precisou deixar que os pais dela o criassem, passou a conviver mais próximo dele só nos últimos anos quando ele começou a estudar na “cidade”, como ela mesmo definiu.

“Ele vinha caminhando na rua sozinho, só ele e Deus, quando foi abordado. Se alguém viu o que aconteceu, ninguém vai falar”, lamentou a mãe, que viveu a frustração de ver o filho ir à Escola para conseguir uma condiçãomelhor do que a que ela conseguiu ter sucumbir ao preço de um celular.

INTERIORIZAÇÃO DA VIOLÊNCIA 

A sociedade mal parou de lamentar a perda de Jaqueline de Oliveira que também tinha 17 anos, assassinada por motivos banais perto de uma escola há pouco mais de 15 dias no município de Barcarena e já acompanha estarrecida mais uma vida que se vai de forma prematura. Ela e Paulo entram agora para as estatísticasalarmantes da violência que está cada vez mais entranhada no interior do país. O crescimento econômico de centros diversificados que não vêm acompanhado de distribuição de renda igualitária e políticas públicas para a juventude na mesma proporção, são fatores causadores dessa chaga de nosso tempo, segundo especialistas.

Dados do último Censo do IBGE revelam que os brasileiros ainda vivem, na sua maioria, no interior (55,1% da população), o que torna essa questão ainda mais problemática. Em 2010, segundo o Mapa da Violência doInstituto Sangari, a diferença entre assassinatos nos interiores em relação às regiões metropolitanas e capitais foi de 67%, sendo que já tinha chegado a ser de 242,2% em 1995, por exemplo. Ou seja, em 15 anos, a diferença diminuiu drasticamente, e a “tendência é que haja cada vez mais uma “democratização da violência”, numa proporção maior do que as medidas adotadas pelo Estado para a promoção de uma cultura de paz”, analisou Vaulene Monteiro, secretária executiva da Pastoral da Juventude, do regional Norte 2 da CNBB.

“A violência está tão intensa aqui que os turnos da noite em grande parte das escolas não vão até às 23h, e sim até às 21h, por uma questão de segurança. Nós nos sentimos sitiados pela violência”, denunciou o professor Nivaldo Macedo, 46 anos. Segundo ele, nos últimos 15 dias pelo menos 12 pessoas morreram na cidade. “Cada dia que passa isso aqui fica mais perigoso”, resumiu dona Solange Lima, 56 anos. Abaetetubense de nascimento, que hoje em dia não fica mais vendo o movimento da rua até tarde da noite, tomando cachaça, como gostava de fazer.

A AÇÃO DA POLÍCIA

Segundo o delegado Maurício de Menezes, que ocupa o lugar do superintendente da Polícia Civil do Baixo-Tocantins enquanto o titular encontra-se de férias, o medo da população em fazer denúncias tem sido um entrave nas investigações, mas a criação do Núcleo de Apoio à Investigação (NAI), o apoio da Divisão de Homicídios e o Empenho da Polícia Civil devem dar a resposta que a sociedade clama. “Nós já identificamos os dois suspeitos do assassinato do adolescente e já estamos no encalço deles”, afirmou. 

Segundo o delegado, num espaço de uma semana, seis homicídios (sendo dois duplos) fizeram com que a sociedade ficasse chocada, mas o compreensível pânico tem feito com que alguns exagerem. “Infelizmente, em alguns casos, o trabalho de investigação não resulta necessariamente na prisão porque algumas testemunhas, que são peças-chave no caso, não têm coragem defalar abertamente. Sempre dizem que ouviram falar”, criticou.