RIO- Dias após o governo do presidente interino Michel Temer anunciar o fim da concessão de bolsas para o programa Ciências sem Fronteiras (CsF) na graduação, acadêmicos ouvidos pelo GLOBO apoiaram a medida. Como justificativa, os especialistas apontam o alto custo do CsF em comparação aos benefícios que apresenta, e a necessidade de investir em pesquisas internamente. A União Nacional dos Estudantes (UNE) criticou duramente a decisão do Ministério da Educação (MEC).
De acordo com a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), a partir de agora, o programa irá focar no ensino de línguas para jovens de baixa renda das escolas públicas, e estudantes de pós-graduação. Em nota, a Capes afirmou que irá honrar as dívidas com as bolsas que ainda estão em vigência e têm contrato até o começo de 2017.
— É triste que isso aconteça, mas é necessário. Estamos no meio de uma crise financeira, temos que manter o programa de iniciação científica que já existe no país. Prefiro manter essas bolsas com mais recursos e esperar a saída da crise para poder voltar com a internacionalização — argumentou a presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Helena Nader, acrescentando ainda que o programa vinha sendo conduzido sem maior avaliação de resultados: — Temos que saber o resultado dessas 80 mil bolsas antes de colocar mais 80 mil. Principalmente em uma época em que estamos cortando bolsas no país.
Cerca de 73 mil bolsas do CsF foram concedidas para graduandos desde o início do programa, em 2011. No total, foram mais de 100 mil bolsas para graduação e pós em universidades de 54 países. De acordo com o ministro da Educação, Mendonça Filho, cada aluno custou aos cofres públicos cerca de R$ 105 mil por ano. Considerando somente dados fornecidos pela Capes — o programa conta também com bolsas financiadas pelo CNPq —, foram investidos cerca de R$ 8,4 bilhões de 2011 até agora.
UNIVERSIDADES SEM RECURSOS
Na opinião de Antônio Freitas, membro da Academia Brasileira de Educação, é um contrassenso gastar esse montante com o CsF enquanto as universidades brasileiras sofrem com a falta de recursos.
— O CsF consome quase R$ 4 bilhões por ano para mandar garotos para Europa e EUA, alguns para universidades boas, mas a maioria para medianas. Por outro lado, excelentes laboratórios , como o da UFRJ estão sem recursos — disse.
Entre as principais áreas atendidas pelo CsF estão os cursos de Engenharia, outros ligados à tecnologia, e carreiras relacionadas à saúde, à indústria criativa, às ciências exatas e da terra. Segundo Mendonça Filho, o montante de R$ 3,7 bilhões utilizado para custear o programa em 2015 é o mesmo valor gasto para financiar a merenda de 40 milhões de estudantes.
Para o sociólogo Simon Schwartzman, o programa como vinha sendo feito não justificava o custo. Ele afirma que o importante é que o governo mantenha o incentivo no âmbito da pós-graduação tanto internamente, quanto no exterior:
— O programa foi mal concebido, o ministério teve que tirar dinheiro de outras áreas, de pesquisas de pós-graduação para financiá-lo. Do ponto de vista da política educacional não é satisfatório.
Presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Carina Vitral, criticou a medida, que classificou como retrocesso.
— O CsF significou muito para muitas pessoas que não tinham condição de fazer intercâmbio. Além disso, traz algo essencial para o ensino superior que é a internacionalização. A justificativa do MEC ao comparar os gastos do CsF com alimentação escolar não leva em conta o quão estratégico ele é para o país. É uma comparação sem cabimento. Se tiver esse pensamento, fará só o básico, porque é mais barato — criticou.
Aluno de medicina da Universidade Federal Fluminense, Matheus Carvalho queria tentar uma vaga no programa quando foi surpreendido pela notícia.
— Pensava em tentar esse ano. Mas devido à crise eu já esperava que uma hora iam cortar. Por outro lado, como meu curso é longo, tenho esperança que voltem com o programa— disse.
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