O índice de mortes por homicídios na população do País entre 0 e 19 anos, que era de 3,1 por 100 mil em 1980, saltou para 13,8 por 100 mil em 2010, um crescimento de 346,4%. É o que mostra o Mapa da Violência 2012 – Crianças e Adolescentes do Brasil. Coordenado pelo pesquisador Julio Jacobo Waiselfisz, o trabalho define a epidemia de violência contra os jovens brasileiros: em 1980, os mortos por homicídio nessa faixa etária representavam 11% do total de casos de assassinato; 30 anos depois, esse porcentual subiu para 43%. Além disso, 11,5% das mortes de jovens em 2010 foram resultado de homicídio; em 1980, o índice era de apenas 0,7%. Para Waiselfisz, esse aumento impressionante mostra que a segurança de crianças e adolescentes não é prioridade das administrações públicas.
A pesquisa situa no tráfico de drogas o universo no qual a violência contra os jovens se manifesta de modo mais agudo. O caso da Bahia é exemplar: o envolvimento de adolescentes com o narcotráfico é visto como o principal responsável pelo fato de, das 13 cidades do País com os maiores índices de crianças e adolescentes assassinados, 8 serem baianas. A cidade que lidera a lista é Simões Filho, com uma taxa de 134,4 mortos por homicídio por 100 mil crianças e adolescentes.
Uma das explicações é que há, desde os anos 80, crescente participação de adolescentes no crime – fenômeno que se justifica, entre outras razões, pela inimputabilidade dos menores de 18 anos. No entanto, ainda que se considere esse contexto social na ponderação estatística do índice, o fato é que o Brasil é um dos campeões de violência contra seus jovens: o índice de 13 homicídios para cada 100 mil crianças e adolescentes é o quarto maior entre 92 países analisados pela Organização Mundial da Saúde, um número até 150 vezes superior ao de países como Inglaterra, Portugal, Itália.
Mesmo o Iraque, que vive uma sangrenta conflagração interna, registra 5,6 mortos por homicídio por 100 mil crianças e adolescentes. Somente na faixa dos 18 anos de idade, de cada 100 mil jovens brasileiros, 58,2 morrem assassinados.
Os pesquisadores que produziram o Mapa da Violência avaliam que boa parte do problema esteja na “naturalização” da violência contra os adolescentes, como se ela fosse algo próprio do mundo dos jovens envolvidos com o crime ou vítimas dele. Na visão desses especialistas, a sociedade não apenas tolera a violência, como uma parte dela a considera necessária para “punir” jovens criminosos.
A conclusão mais importante, porém, talvez seja a de que o poder público não sabe como lidar com a violência crescente. Em 2000, por exemplo, o Plano Nacional de Segurança Pública procurou conciliar a repressão ao crime com ações sociais, mas, como se concentrou nas grandes cidades, surgiram novos polos de criminalidade no interior do País, onde as instituições são menos aparelhadas para combatê-la.
O Estado que teve o maior índice de homicídios de jovens em 2010 foi Alagoas, com 34,8 por 100 mil habitantes; em 2000, porém, ele era o décimo da lista, com um índice de 10,1 por 100 mil. Essa evolução talvez seja um dos sinais mais impactantes da migração da violência verificada pelo estudo.
Mesmo nos grandes centros, porém, a eventual queda dos índices de criminalidade não pode ser atribuída exclusivamente ao reforço policial ou a ações integradas de segurança pública e ação social. No caso da cidade de São Paulo, por exemplo, houve redução de 85,2% no total de homicídios de crianças e adolescentes entre 2000 e 2010, mas analistas ouvidos pelo jornal O Globo consideram que uma parte desse número é resultado da “pax mafiosa” – isto é, da hegemonia de um determinado grupo criminoso, como o PCC. “Essa organização não tem seu poder ameaçado por outras organizações. Não há disputa por território”, explicou Pedro Abramovay, ex-secretário nacional de Justiça. Assim, o recrudescimento ou o refluxo da violência que atinge os jovens parece não depender só da ação do Estado, mas também dos humores dos chefões do crime organizado.
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