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A Flacso Brasil presta homenagem aos trabalhadores e trabalhadoras neste 1º de maio marcado pela pandemia de Covid-19.
Aproveitamos a data para conversar com as autoras do artigo Trabalhadoras domésticas e a covid-19 no Brasil: Encenando resistências, apresentando cenários e desafios, Maria Izabel Monteiro Lourenço, presidenta do Sindicato dos Trabalhadores Domésticos do Município do Rio de Janeiro, e Mary Garcia Castro, professora e pesquisadora da Flacso Brasil e da UFRJ, e trazer dados atualizados sobre o tema.
No artigo, as autoras abordam questões como o perfil das trabalhadoras domésticas no Brasil, desafios, legislação trabalhista, sindicalização, a luta das trabalhadoras em tempos de Covid-19 e lembram que  “o primeiro caso de óbito pela Covid-19 no Rio de Janeiro foi de uma trabalhadora doméstica diarista, contaminada por sua empregadora”. 
Números e cenário
A pesquisadora Mary Garcia Castro aponta que os dados mais recentes sugerem uma “tendência de agravamento das vulnerabilidades e dos efeitos da pandemia” em relação às trabalhadoras domésticas. 
Houve uma queda de 23,4% nos postos de trabalho doméstico remunerado entre o 4º trimestre de 2019 e de 2020.  De 6,4 milhões de pessoas empregadas, o setor passou a empregar 4,9 milhões. Uma perda de cerca de 1,5 milhão de postos de trabalho entre as trabalhadoras domésticas em um ano. A queda é superior à diminuição de ocupação no quadro geral no país, que foi de  8,7% no mesmo período. 
Os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para o 4º trimestre de 2019 e 2020, divulgados pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE) em 27 de abril de 2021.
A pesquisa mostra também que houve redução do trabalho doméstico com e sem carteira assinada. Em 2019, 1,6 milhão de trabalhadoras domésticas trabalhavam com carteira assinada e 4,3 milhões, sem carteira. Já em 2020, são 1,1 milhão com carteira e 3,4 milhões sem carteira.
Nos sindicatos, como o que Maria Izabel Monteiro dirige no Rio de Janeiro, surgem relatos de sofrimentos das mulheres que estão por trás de tais números. São casos de exploração e até mesmo de cárcere privado e trabalho análogo à escravidão, como os denunciados recentemente pela imprensa.
“Durante a pandemia, algumas trabalhadoras foram obrigadas a ficar em seus locais de trabalho. Alguns empregadores praticamente as obrigaram: ou ficavam ou eram demitidas”, afirma Maria Izabel Monteiro. 
Ela aponta que o desemprego é um problema central e que “as trabalhadoras diaristas foram as mais prejudicadas, pois ficaram sem garantia alguma, muitas delas nem sequer têm a previdência social garantida”. 
Para enfrentar os novos desafios, “os sindicatos da categoria entraram em campanhas nacionais, como a  Cuida de Quem te Cuida e o Movimento Pela Vidas de Nossas Mães, liderado por filhos de trabalhadoras domésticas”, relata Maria Izabel Monteiro. 
Para Mary Garcia Castro, as trabalhadoras domésticas remuneradas são “uma das categorias que historicamente mais vêm sofrendo com as desigualdades sociais por situação de classe, raça/etnicidade e sexo/gênero;  que mais vêm sofrendo com a pandemia e o estado da economia política, mas que, por outro lado, nestes tempos vem impondo resistências, protestos, apresentando-se nas redes sociais, no virtual, mobilizando-se em muita lives, construindo discursos e ações  próprias, que inclusive passam por ajuda mutua, como  as campanhas que acionaram -“Cuida de quem te cuida” e “Vacina, Ajuda Emergencial e não ao Desemprego”- e ampla distribuição de cestas básicas para aquelas em estado de fome pelos seus sindicatos e sua Federação Nacional de Trabalhadoras Domesticas (FENATRADE) pelo Brasil afora”.
Direitos Trabalhistas, a principal demanda
“Geralmente, nos sindicatos, as maiores reclamações são o descumprimento da Lei trabalhista. Trabalhadoras no sindicato que trabalharam anos na mesma família e as mesmas não garantiram os direitos a essas mulheres”, relata Maria Izabel Monteiro.
Ela relembra o histórico de desigualdade com relação à categoria: “quando foi criada a CLT, em 1942, as trabalhadoras domésticas não foram incluídas na Lei Trabalhista. Seus primeiros direitos foram conquistados em 1972 e, mesmo assim, diferenciados das outras categorias: vinte dias de férias, não tinha direito a feriados, décimo terceiro, e os empregadores não tinham a obrigação de garantir os direitos”.
“As trabalhadoras domésticas foram reconhecidas como profissionais depois da constituição de 1988: os direitos foram ampliados, passaram a ter 30 dias de férias, décimo terceiro, licença maternidade e feriados. Em 2013, com a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) das Domésticas (PEC 66/2012), passaram a ter direito à jornada de trabalho de 8 horas diárias, já assegurado a outras categorias profissionais” afirma.
Para Mary Garcia, tal ocupação “conjuga os efeitos da cultura patriarcal, racismo estrutural, colonialidade e um sistema de classe que se configura por  falta de oportunidades de trabalho para os mais pobres”. “Estes são desafios estruturais que se juntam a desafios conjunturais, de tempos de desrespeito a direitos trabalhistas conquistados. Elas reivindicam hoje prioridade na vacinação já que estão em  serviço essencial; auxílio emergencial decente; condições de isolamento e/ou transporte seguro e fiscalização de seus direitos, como manda a lei, ou seja: ‘renda, vacina, respeito  e garantia de direitos’”, completa.
Mary Garcia lembra a fala da presidente da FENATRAD, Luísa Batista, em entrevista informal concedida a ela em abril de 2021: “Não somos descendentes de escravos, mas de povos livres traficados que resistiram e resistem, lembrando que a organização do trabalho doméstico no Brasil tem  85 anos de luta. O nosso trabalho tem valor, se não fosse o trabalho doméstico como tantas e tantos outros iriam trabalhar?”.