O delegado responsável pela operação Research (Pesquisa, em ingês), deflagrada nesta quarta-feira (15) para apurar o desvio de R$ 7,5 milhões via pagamento bolsas de estudos na Universidade Federal do Paraná (UFPR), disse estar “estarrecido, chocado, com a grosseira fraude” apontada pela investigação. Para o TCU (Tribunal de Contas da União), o esquema não tem precedentes em outras instituições de ensino superior.
A Polícia Federal prendeu 29 pessoas no Paraná, Mato Grosso do Sul e Rio de Janeiro. Duas delas são servidoras da UFPR; eram a chefe da Seção de Controle e Execução Orcamentária e a chefe da Secretaria Administrativa do Gabinete da Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação (PRPPG).
A atual vice-reitora da instituição, Graciela Bolzon, é uma das oito pessoas que foram levadas para prestar depoimento sob condução coercitiva. Como coordenadora de Pesquisa e Desenvolvimento da Ciência e Tecnologia, ela assinou 215 processos de concessão de pagamentos, diz a PF.
Também foram levados à PF, para prestar depoimentos, Edilson Sergio Silveira, ex-pró-reitor de Pesquisa e Pós-Graduação, e Lucia Regina Assumpção Montanhini, ex- pró-reitora de Planejamento, Orçamento e Finanças. São suspeitos, respectivamente, de autorizar o pagamento em 19 processos e de ordenador pagamentos e assinar autorizações de pagamento de bolsas em nove casos, segundo a PF.
“A investigação detectou o desvio de R$ 7,5 milhões entre 2013 e 2016 mediante pagamentos sistemáticos e fraudulentos de bolsas de pesquisas a pessoas sem qualquer vínculo com a UFPR. Não são alunos, professores ou servidores. A maioria sequer tem curso superior. Nenhum tem currículo no sistema Lattes (obrigatório para que disputa uma bolsa de pesquisador). Há beneficiários do Bolsa-Família entre os que recebiam bolsa”, relatou o delegado Felipe Hayashi, coordenador da operação.
“A fraude parte de instâncias que figuram logo abaixo da reitoria. Foram elaborados simplórios processos de pagamento, notas de empenho e autorizações. As fraudes poderiam ter sido detectadas na UFPR caso houvesse controle interno efetivo”, criticou. “É possível que haja denúncia criminal por omissão contra gestores que deveriam agir, sejam o reitor [à época, Zaki Ackel Sobrinho] ou pró-reitores que assinaram processos de pagamentos fraudulentos.”
Há pagamentos de bolsas de até R$ 24 mil mensais. O valor é muito superior ao que é pago a pesquisadores. Além disso, os processos de pagamento não seguiam os ritos habituais — não continham, por exemplo, qual a pesquisa desenvolvida pelo beneficiado.
“A chefe da seção de orçamentos elaborava as notas de empenho e as assinava. Depois, colhia assinaturas dos pró-reitores de Pesquisa e Pós-Graduação e, dali, o processo ia para a pró-reitoria de Planejamento, Orçamento e Finanças. Finalmente, o processo seguia para o setor de contabilidade e finanças. Eram várias instâncias que deveriam ter atentado para os problemas dos processos”, disse Hayashi.
“Nada jamais foi encontrado [pelo TCU] nessa escala [em outras universidades federais] até o momento. Houve um caso no Rio Grande do Sul, mas que envolvia [pagamentos irregulares] a pessoal da própria universidade. Com [dinheiro desviado a] pessoal de fora, é a primeira vez”, falou João Manoel Dionísio, responsável pela Research no TCU.
PF, TCU e Controladoria Geral da União, que também participa da operação, ainda não sabem como o esquema foi montado. Mas há a suspeita de que as pessoas que recebiam as bolsas –há um ajudante de cozinha, um motorista e uma dona de salão de beleza no grupo; alguns são parentes– tenham sido aliciados como laranjas, devolvendo parte do dinheiro recebido.
“Eles receberam o dinheiro em contas bancárias próprias. Os interrogatórios vão mostrar como era o modus operandi”, afirmou o delegado.
O juiz Marcos Josegrei da Silva, da 14a Vara da Justiça Federal do Paraná, determinou a apreensão de bens dos presos, inclusive de diversos veículos com valor superior a R$ 40 mil.
A UFPR, onde dá aulas o juiz federal Sergio Moro e já lecionou o ministro do Supremo Tribunal Federal Edson Fachin, emitiu nota oficial sobre a operação. Leia a íntegra a seguir.
Diante da operação deflagrada nesta quarta-feira pela Polícia Federal, a Universidade Federal do Paraná informa:
- As suspeitas de irregularidades no pagamento de bolsas e auxílios são objeto de investigações internas na UFPR desde dezembro de 2016, quando a própria universidade também tomou a iniciativa de encaminhar o caso à Polícia Federal, para investigação criminal.
- Assim que tomou conhecimento da suspeita de desvios de verba pública, em dezembro de 2016, a administração anterior da Reitoria determinou a abertura de sindicância para apurar responsabilidades. O procedimento é conduzido por uma comissão formada por dois professores e uma servidora técnico-administrativa e, por força de lei, corre em sigilo. O prazo para conclusão do trabalho é de 60 dias, prorrogáveis por mais 60. A previsão de término dos trabalhos é meados de abril de 2017.
- Por determinação do atual reitor, Ricardo Marcelo Fonseca, as duas servidoras suspeitas de envolvimento no caso foram suspensas do exercício de suas atividades funcionais, nos termos da Lei 8112/90.
- O reitor Ricardo Marcelo Fonseca também determinou a criação do Comitê de Governança de Bolsas e Auxílios, visando aperfeiçoar os mecanismos de controle sobre esse tipo de pagamento. Também está criada, por meio de portaria, uma comissão para trabalhar no Plano de Transparência e de Dados Abertos da Universidade, instrumento para garantir que a sociedade tenha acesso a todas as informações de caráter público.
- A Universidade Federal do Paraná tomou todas as providências cabíveis para esclarecer os fatos e responsabilizar os eventuais envolvidos. Com o resultado da investigação, a UFPR solicitará a restituição dos valores ao erário.
- A gestão do reitor Ricardo Marcelo Fonseca reafirma seu compromisso com a transparência e a ética. Reforça ainda que condena veementemente qualquer prática ilícita e que continuará colaborando com as investigações, tanto no âmbito do Tribunal de Contas da União quanto da Polícia Federal.
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