Mais de R$ 631 mil estão sendo gastos pela USP (Universidade de São Paulo) em obras de reforma na área externa do prédio da reitoria da instituição.
O valor foi estabelecido através de um contrato com a empresa Senca Serviços e Engenharia Ltda, ganhadora de um processo licitatório para a execução das obras.
A previsão é de que sejam gastos pelo menos R$ 631.103,27 para obras classificadas como “ampliação do estacionamento para veículos, refazimento do calçamento para a circulação de pedestres, controle de acesso por meio de cercamento e paisagismo”.
As especificações são da SEF (Superintendência do Espaço Físico), órgão da USP responsável pela administração dos espaços da instituição.
A reportagem esteve presente no local na última segunda-feira (16) e observou pouca movimentação nas obras, que se resumiam à instalação de grades e de portões para acesso de veículos em áreas pontuais próximas ao prédio da reitoria.
Crise financeira
As obras acontecem em um momento de crise financeira na universidade, que desde 2013 vem tomando medidas para equilibrar as contas. Desde 2012, a USP vem usando suas reservas bancárias –em 2015, viu o saldo de sua poupança despencar de R$ 3,61 bilhões para R$ 1,3 bilhão. Em uma estimativa feita na metade do ano passado, a universidade previu encerrar 2016 com um deficit de R$ 868 milhões.
“Saber que a prioridade da USP é o desenvolvimento de um ‘projeto paisagístico’ da própria reitoria é no mínimo revoltante”, afirma Gerson Salvador, médico do HU (Hospital Universitário) desde 2010.
Salvador conta que o HU foi uma das unidades que mais sofreram com a adesão dos funcionários ao PIDV (Programa de Incentivo à Demissão Voluntária), apresentado em 2014 e em 2016 pelo reitor Marco Antonio Zago como parte de um pacote de medidas para contenção dos gastos da universidade.
“Muitos profissionais se desligaram do hospital. Não havia gente suficiente para cuidar da estrutura. Por conta do PIDV, 40% dos leitos de UTI (Unidade de Tratamento Intensivo) e duas salas de centro cirúrgico foram fechadas”, diz Salvador.
Ele lembra que o hospital, que já foi referência de atendimento em São Paulo, hoje atende apenas casos graves –e em horário reduzido.
“À noite, o pronto-socorro da pediatria não funciona, porque não tem gente [para trabalhar]. Nós estamos no meio da crise, ainda. As consequências do PIDV continuam se arrastando até hoje.”
“Cartão-postal”
Para Claudionor Brandão, diretor do Sintusp (Sindicato dos Trabalhadores da USP), as obras de reforma são uma tentativa de “transformar a reitoria em cartão-postal da universidade” e de “cerceamento do direito de organização dos trabalhadores”.
Instaladas nas últimas semanas, as grades não cercam apenas o prédio da reitoria. Elas limitam o acesso a uma área verde de uso dos estudantes, conhecida como “prainha”, e ao prédio da “vivência”, onde se encontram a sede do Sintusp, uma lanchonete e as sedes do centro acadêmico e da atlética da ECA (Escola de Comunicações e Artes).
“Ele [o reitor Zago] está desmontando a universidade com um discurso de que “não tem dinheiro”. Agora, para cercar o sindicato, tem [dinheiro]”, afirma Brandão.
“Essas obras de reforma da reitoria representam, na nossa opinião, total desperdício de dinheiro e distorção de prioridade. A universidade não precisa de cartão-postal. Precisa de trabalhadores, de professores, precisa botar o hospital com equipamentos para funcionar”, ressalta.
Segurança patrimonial
Questionada sobre as justificativas para a execução da reforma em um momento de crise, a SEF respondeu que “a reordenação das vagas e ampliação do estacionamento para os veículos se mostrou necessária. Além disso, a segurança patrimonial exigiu o cercamento em função de invasão do prédio da reitoria, da tentativa de furto no espaço da área expositiva e de outras áreas, com a quebra de vidros do andar térreo. Com o cercamento também se tentará evitar as constantes pichações nas paredes do prédio da reitoria e da ECA”.
Em junho de 2016, um grupo de estudantes ocupou a área externa da reitoria para reivindicar a adoção imediata de cotas raciais pela universidade. Na ocasião, houve confronto entre a PM e os manifestantes e alguns vidros do térreo do prédio, que comportava à época uma exposição de moedas antigas de acervo do MAE (Museu de Arqueologia e Etnologia), foram quebrados.
Segundo a assessoria de imprensa da USP, no entanto, não houve oficialmente uma tentativa de furto, e sim receio de que o acervo sofresse algum tipo de prejuízo.
Segundo a SEF, três empresas participaram do processo licitatório para as obras, que têm previsão de conclusão para o fim de fevereiro. O órgão também afirma que até o momento não houve reajustes no valor do contrato e que o dinheiro gasto com a reforma provém do orçamento da USP.
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