Estudo divulgado pelo Mapa da Violência aponta que 40% das vítimas de homicídios em Rio Preto têm idade entre 15 e 29 anos. Pela primeira vez o levantamento calculou os crimes separando jovens por raça e cor e concluiu que a taxa de negros assassinados é três vezes maior do que a de brancos.
Os números definem a taxa de assassinatos para cada grupo de 100 mil habitantes. Os dados são subtraídos das certidões de óbitos expedidas pelos cartórios de registro civil do município durante o ano e tratam como homicídio mortes provocadas com armas até acidentes de trânsito culposos (sem intenção de matar).
O levantamento usa dados de 2012, que registrou sete jovens brancos e oito negros assassinados. No geral, a pesquisa mapeou 37 homicídios dolosos ou não, o que deu para Rio Preto uma taxa de 8,9 mortes para cada 100 mil habitantes. Dados do IBGE indicam que na época a cidade tinha 76.930 jovens brancos e 25.734, negros.
Para o sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz, autor da pesquisa, mesmo com uma população três vezes menor, o jovem negro está mais suscetível a ser vítima de mortes violentas como assassinatos porque sofre com condições estruturais impostas pela sociedade dominante de maior poder aquisitivo.
“Ao longo dos anos isso aconteceu com as áreas da educação e saúde. Quando é preciso pagar para ter um serviço de qualidade, eficiente, somente aqueles que têm condições o fazem. Agora vem acontecendo também com a segurança pública. Ou seja, na maioria dos casos, quem tem condições de pagar é o branco. Daí, ele tem a segurança oferecida pelo Estado e também a privada, o que o torna mais protegido”, explica o sociólogo.
O especialista aponta ainda outro motivo que coloca o jovem negro na linha de frente como vítima da violência: o cenário político. “No cardápio deles, eleitos ou não, quem está distante do poder aparece menos. Ou seja, na prática, quando morre um empresário é notícia. Quando um jovem negro é assassinado na favela é rotina”, compara.
Nos últimos três anos, o estudo aponta que foram assassinados 39 jovens brancos e 25 negros em Rio Preto. A maior diferença ocorreu em 2010, sendo 20 casos contra sete, respectivamente. Para Jacobo, o levantamento comprova a redução da violência contra brancos. Ele afirma que os números nacionais confirmam a tendência.
Segundo o estudo, efetivamente, entre os brancos, no conjunto total da população, o número de vítimas diminui de 19.846 em 2002 para 14.928 em 2012, uma queda de 24,8%. Já entre os negros, as vítimas aumentaram de 29.656 para 41.127, um crescimento de 38,7%.
Linha de frente
Para o delegado Alceu Lima de Oliveira Junior, responsável pelo setor de homicídios da DIG (Delegacia de Investigações Gerais) de Rio Preto, em números absolutos é difícil separar as vítimas da violência entre jovens brancos e negros. “Quando a gente atende uma ocorrência, inicia uma investigação, a cor ou raça da vítima não é levado em consideração. Mas com certeza, falando assim, percebo que os crimes ocorrem com mais frequência em bairros da periferia, onde geralmente a predominância da população negra é maior”, afirma.
Segundo o Mapa da Violência, a categoria negro resulta do somatório entre pretos e pardos, definidos pelo IBGE na hora da coleta de informações para atualização do censo populacional em que o próprio indivíduo aponta sua auto classificação entre cinco opções: branca, preta, parda, amarela ou indígena. Para o promotor criminal José Heitor dos Santos, é preciso ter cautela ao pontuar, atualmente, que o jovens negros são maioria entre as vítimas de assassinatos. “Hoje a legislação de cotas, que define cor ou raça, por exemplo, é muita ampla. O que é negro, afinal? Além disso, a classificação na certidão de óbito é realizada por um agente externo e nem sempre quando chega para nós está correta”, afirma.
Votuporanga lidera ranking
O Mapa da Violência tem 185 páginas e traz o mapeamento dos assassinatos cometidos contra jovens brancos e negros nos 5.565 municípios do País. Em 2012, no noroeste paulista, a cidade com maior taxa de homicídios contra negros foi Votuporanga, que teve 62 casos para cada grupo de cem mil habitantes.
Segundo o levantamento, em 2012, na região a média de jovens brancos assassinados foi de 12 casos para cada cem mil habitantes e de negros, 25 casos. O sociólogo Julio Jacobo diz que, embora os números ainda sejam altos, o estado de São Paulo apresentou redução dos índices. Em uma década, chega a 68%.
Medo
A doméstica Rosaly Berto Pereira, 46 anos, não vai esquecer tão cedo o dia 27 de agosto do ano passado. Ela estava em casa, no bairro Jardim Oliveiras, quando chegou a notícia de que seu filho de 16 anos havia sido vítima deu ma tentativa de assassinato e foi baleado na perna. “Felizmente ele está aqui e se recuperou bem”, afirma. A mesma sorte não teve o colega que estava com seu filho. O jovem N.D.M, 22 anos, levou nove tiros e morreu horas depois no hospital. “Ele conta que os caras já chegaram atirando e só deu tempo de correr”, lembra a doméstica. Com medo de represália, a famíliateve de ser mudar do bairro e esconde o novo endereço.
No ano passado, a diarista Maria Helena Araujo, 51 anos, também passou por susto parecido depois que a filha de 16 anos foi vítima de um tiro que acertou sua cabeça de raspão. Ela estava junto com o namorado D.N.S.N, 23 anos, que era o principal alvo da tentativa de homicídio. Após ser baleado ele foi socorrido e sobreviveu. “(foi) Uma situação horrível. Deixei na mão de Deus”, diz a mãe. O crime ocorreu em outubro do ano passado, quando o casal de namorados estava próximo à residência, no Jardim Itapema.
Segundo ela, os acusados pelos disparos nunca foram identificados e família não quer mais saber do caso. “Não queremos mais mexer com isso.” Vítimas da violência, as famílias evitam a exposição pública e não querem ser fotografadas.
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