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O Ministério Público Federal investiga 70 denúncias de existência de universidades clandestinas, sem autorização do Ministério da Educação (MEC), em todo o país. As denúncias, recebidas nos últimos dois anos pelas procuradorias regionais dos Direitos do Cidadão, indicam que instituições de ensino abriram cursos de graduação e pós-graduação sem sequer estarem credenciadas no MEC ou com diversos problemas no credenciamento.

A maioria das acusações é oriunda das regiões Centro-Oeste e Norte e foi efetuada por alunos com problemas para obter seus diplomas ou através de notícias da imprensa e ações do próprio Ministério Público. Há também denúncias de propagandas irregulares e promessas não cumpridas pelas instituições de ensino.

A procuradoria do Pará passou a investigar sistematicamente essas denúncias e, nos últimos dois anos, fechou 16 cursos de graduação por não terem autorização oficial de funcionamento ou por descumprirem outras regras estabelecidas pelo MEC.

Só nos primeiros dois meses de 2014, foram fechados no Pará os cursos universitários do Instituto Brasileiro de Educação e Saúde (Ibes); e os cursos oferecidos em parceria pelo Instituto Educacional Convictu’s; pela Faculdade Aberta de Filosofia, Teologia, Educação Física e Pedagogia Religiosa (Faentrepe); e pela Escola de Formação Teológica e Profissional (Eftepro).

Serviços irregulares em outro estado
Segundo o procurador regional dos Direitos do Cidadão do Pará, Alan Rogério Mansur Silva, existe um esquema fraudulento em que os alunos fazem os cursos de graduação e pós-graduação de maneira irregular e conseguem o diploma de forma aparentemente regular.

“É uma falsidade formal no final. Na maioria dos casos que apurei, existe uma faculdade credenciada pelo MEC em um estado da federação que passa a prestar serviços em outro estado sem ter a autorização. No final, o aluno ganha o diploma através de um mecanismo chamado aproveitamento extraordinário, o que acabou criando um mercado disso”, afirmou o procurador.

O “aproveitamento extraordinário de estudo” é uma medida prevista na Lei 9.394/96 para que “alunos que tenham extraordinário aproveitamento nos estudos, demonstrado por meio de provas e outros instrumentos de avaliação específicos, aplicados por banca examinadora especial, poderão ter abreviada a duração dos seus cursos, de acordo com as normas dos sistemas de ensino”.

O objetivo da lei é, por exemplo, aproveitar o conhecimento de alunos que tenham proficiência em alguma língua estrangeira e evitar que o estudante seja obrigado a fazer uma disciplina de mesmo conteúdo já obtido. Mas, segundo o procurador Mansur Silva, na fraude investigada pelo MPF o processo é inverso: alunos que não adquiriram o conhecimento passam a ter certificados que atestam o estudo.

“Os alunos encontram uma flexibilidade enorme nessas faculdades. Alguns pagam alguns meses de mensalidade e, logo depois, uma taxa para fazer um exame, que é oferecido como forma de ter o diploma mais rápido. A faculdade, por ser irregular em determinados estados, fornece os diplomas na sede onde é credenciada”, disse Mansur Silva.

Para o procurador, uma forma de descobrir quantos diplomas foram expedidos irregularmente é cruzar o registro de entrada de alunos das universidades e a quantidade de diplomas emitidos através do esquema. Com isso, as instituições poderiam ser descredenciadas, como foi o caso da Faculdade de Tecnologia AD1, que tem sede no Distrito Federal e atuava no Pará em parceria com outra instituição, a Unisaber.

A AD1, segundo nota técnica da Coordenação-Geral de Supervisão da Educação Superior, do MEC, administrava instituições de ensino localizadas no Pará e tinha irregularidades na gestão administrativa e acadêmica de suas instituições. Entre as irregularidades, estariam a mudança de local de funcionamento sem autorização do MEC, o não atendimento de prazos para protocolo de pedido de reconhecimento de curso, a não entrega dos diplomas aos concluintes dos cursos de graduação e o desrespeito à determinação de suspensão de matrículas de novos alunos.

Mansur Silva disse considerar a relação entre a AD1 e a Unisaber “estranha e equivocada” para duas instituições de ensino. Em seu site, a Unisaber afirma que tem como marca a “garantia de construção de uma educação para o mundo que queremos”. O diretor-geral da universidade, professor Walter de Paula, foi eleito presidente da Associação Brasileira das Faculdades Particulares (ABRAFaculdades).

O MEC e o Conselho Nacional de Educação (CNE) foram procurados pelo GLOBO, mas não comentaram o assunto até o fechamento da edição. O MEC possui um site (http://emec.mec.gov.br/) em que o estudante pode verificar se a instituição em que estuda está credenciada ou não.

Unisaber nega irregularidade
Em seu site, a Unisaber divulgou uma nota oficial em que afirma que “não possui turmas de alunos nas cidades de São Paulo de Olivença, Tonantins, Amaturá e Tabatinga”. E afirma: “Chegou a nosso conhecimento que um servidor público está praticando de forma precipitada e irresponsável denúncias difamatórias contra membros da nossa instituição em reuniões coletivas”. A instituição afirma ter protocolado denúncia no Conselho Nacional do Ministério Público para que se investigue o caso nas cidades amazonenses, mas não menciona a denúncia sobre irregularidades no Pará. As outras instituições foram procuradas pelo GLOBO, mas não atenderam as ligações ou não responderam às solicitações de entrevista.

Fonte: GLOBO