SÃO PAULO – Depois de concluir o ensino médio dentro da Fundação Casa, Jonas (nome fictício), de 17 anos, não acreditou quando foi aprovado na Faculdade de Tecnologia (Fatec) de Jacareí, no interior de São Paulo. Antes de ser internado, ele sequer imaginava que poderia entrar em uma faculdade. Como ele, outros jovens internos foram aprovados em processos seletivos de universidades e Escolas Técnicas Estaduais (Etecs) e passam parte do período de internação fazendo cursos técnicos profissionalizantes e graduações.
Entre os 350 mil candidatos que disputaram as 88,7 mil vagas dos cursos técnicos das Etecs de São Paulo, no primeiro semestre deste ano, 127 eram internos da Fundação Casa (Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente). Mesmo sem fazer um cursinho específico preparatório para as concorridas vagas, 19 deles foram aprovados. Além de Jonas, uma interna conquistou uma vaga no curso de Biocombustíveis na Fatec de Araçatuba, no interior.
Também neste ano, nove jovens foram aprovados em faculdades públicas e privadas por meio do Sistema de Seleção Unificada (Sisu), do Programa Universidade para Todos (ProUni), ou com bolsas cedidas pelas próprias faculdades.
Todos os internos que tenham a escolaridade exigida nos cursos podem se inscrever, não importa o motivo pelo qual eles foram para a fundação.
Autorização. Para estudar, porém, todos precisam de autorização judicial e são acompanhados em todo o trajeto até as instituições de ensino. “Já tivemos caso de adolescente que passou em Etec e o juiz não autorizou que ele saísse, porque defendeu que o jovem ficasse privado de liberdade. Recorremos, mas não ganhamos, e nesse caso o jovem realmente não pode frequentar o curso”, afirma Marisa Fortunato, superintendente pedagógica da Fundação Casa.
Além da autorização, outros fatores apontados pela fundação para o baixo número de aprovados comparado ao total de internos da rede são a alta rotatividade nos centros, o nível de escolaridade com o qual os jovens chegam à fundação e a resistência em prestar provas.
Dentro da fundação, os internos têm aulas regulares do ensino básico, oferecidos pela rede estadual de Educação, em salas multisseriadas – divididas entre ciclo 1 do ensino fundamental (1.º ao 5.º ano), ciclo 2 do ensino fundamental (6.º ao 9.º ano) e ensino médio. Também são oferecidos cursos profissionalizantes e atividades de artes e de cultura.
Quem pode estudar em outras instituições tem de fazer tanto as aulas de fora quanto as de dentro da fundação, no período em que estiver internado. O Estado acompanhou a rotina de três internos da Fundação em Jacareí. Além de Jonas, dois outros internos da mesma unidade foram aprovados para a Etec da região.
“Os professores me disseram que, se eu me inscrever depois em um estágio em uma fábrica posso ganhar de R$ 3 mil a R$ 4 mil, dinheiro que eu nunca imaginei ganhar. Se juntar tudo isso, não dá o que a minha mãe e o meu pai ganham por mês”, disse Jonas.
Quando saem para as aulas, eles podem tirar o uniforme da fundação e usar as próprias roupas ou os uniformes das Etecs. Apenas o diretor das instituições sabe que eles estão cumprindo medidas socioeducativas. Nem professores nem colegas sabem que eles estão internados, para evitar que sejam expostos.
“Antes eu ia para a escola, mas nem sei por que ia, porque era empurrado de um ano para o outro”, afirma Artur (nome fictício), aprovado na Etec de Jacareí. Ele foi apreendido no ano passado, meses antes de completar 18 anos, por roubo. “Agora quero mostrar para mim mesmo que posso ter vida nova.”
Comentários