Crianças e jovens são alvos cada vez mais frequentes de homicídios e de violência urbana e doméstica. Precisamos de políticas mais efetivas para frear, o quanto antes, esse crescimento da violência, diz dirigente da Fundação Abrinq
Por Heloisa Helena de Oliveira*
Estamos nos tornando, a cada dia, uma sociedade mais violenta em casa, nas escolas, no trânsito, e na convivência social. Para dar uma ideia da importância desse assunto, gostaria de citar a publicação Mapa da Violência 2013 – Homicídios e Juventude no Brasil, do professor Julio Jacobo Waiselfisz, que compara os índices brasileiros aos resultantes dos conflitos armados.
É difícil de acreditar, mas os 206.005 homicídios ocorridos no Brasil, no período de 2008 a 2011, são semelhantes ao total de mortes diretas ocorridas nos 62 conflitos armados pelo mundo nesse espaço de tempo, que é de 208.349. De acordo com a fonte, esse montante de homicídios é superior ao número de mortes ocorridas nos 12 maiores conflitos armados no mundo entre 2004 e 2007.
Esses números não podem ser minimizados e nem associados ao gigantismo e às dimensões continentais do Brasil, já que outros países com população semelhante à nossa, como é o caso de Paquistão e Índia, têm taxas bem menores. A desigualdade social e o crescimento populacional acelerado sem planejamento urbano podem ser fatores que expliquem melhor esses números.
Se olharmos para este mapa de forma regionalizada e em números absolutos, percebemos que a região Nordeste concentra o maior número de homicídios, com 19.405 casos em 2011. O estado da Bahia é o que lidera o ranking de violência fatal, com 5.451 homicídios no mesmo ano. Não à toa, é a região que apresenta os piores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) do país, se considerarmos a relevância populacional.
Essa reflexão é muito importante para pensarmos sobre a sociedade em que vivemos e as nossas mazelas sociais. Ainda que a vitimização seja preponderantemente masculina, há uma violência que atinge especificamente as mulheres: embora a Lei Maria da Penha, em vigor desde 2006, tenha trazido maior rigor nas punições da violência contra as mulheres, ainda persistem casos de violência contra mulheres, segundo pesquisa recém-lançada pelo IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. No ranking, o estado que lidera esse tipo de violência é o Espírito Santo.
Apesar de os homicídios serem ainda as principais causas de mortes externas entre a população jovem, não se pode deixar de atentar para as mortes causadas por acidentes de trânsito, segunda maior causa. Em 2011, a cada 100 mil mortes, 89,4 foram por causas externas e, delas, 41,1 por homicídio e 21,9 por transporte. Isso significa que a violência no trânsito é importante nesse tipo de estatística.
Outra fonte importante de dados sobre a violência é o Disque 100, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, que em sua classificação tem um Módulo Criança e Adolescente, onde as denúncias são agrupadas em Negligência, Violência Física e Psicológica, e Violência Sexual.
De janeiro a agosto de 2011, foram 50.866 denúncias recebidas pelo serviço, sendo de 209 a média por dia no ano. Também nesse caso, a região Nordeste está no topo do ranking, com 39% das denúncias do país, o que equivale a 38,16 denúncias por grupo de 100 mil habitantes. Apesar disso, São Paulo é a unidade da federação que mais recebeu denúncias, com 66,37 denúncias por grupo de 100 mil habitantes.
Quando olhamos para os tipos de violência e de vítima, chegamos a outros dados alarmantes. Em todas as unidades federativas, as meninas sofrem, de forma geral, mais violência que os meninos. Isso acontece principalmente quando se trata de violência sexual: em 78% das denúncias desse tipo em 2011 as vitimas eram do sexo feminino. A violência física e psicológica, ainda, está no topo das causas de registro de denúncias ao serviço, com 37%; seguida por negligência, com 35%; e por último, a violência sexual, com 28%.
Sabemos que a família é a célula da sociedade onde o indivíduo deve crescer e se desenvolver em segurança. Baseando-nos nas estatísticas do Mapa da Violência 2012 que pormenorizou a violência junto ao público infantil e adolescente, podemos observar que é também nos seus domicílios que as crianças sofrem mais violência, sendo que os pais são os principais agressores: a mãe é a principal responsável pelas agressões, com 19,6%; amigos e conhecidos ficam em segundo lugar, com 17,6%; e o pai é responsável por 14,1%das agressões denunciadas.
As crianças deveriam ser prioridade absoluta no país. Os adolescentes são o nosso futuro mais próximo. Os índices cada vez mais crescentes de violência contra esses grupos nos mostram não só um presente, mas também um amanhã muito tristes. Para enfrentar esse problema, é preciso construir uma nova cultura, sem violência, em todas as dimensões da nossa convivência social.
* Economista, com MBA para Executivos e especialização em Governança Corporativa pela Universidade de São Paulo (USP), presidiu a Fundação Banco do Brasil e é a administradora executiva da Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança e do Adolescente.
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