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Em sua décima quinta edição, exame que foi criado para avaliar o aluno do Ensino Médio acumula mais funções a cada ano e é alvo de críticas por parte dos educadores: seria uma forma de o governo pressionar as universidades a aderirem?

No próximo fim de semana, dias 26 e 27 de outubro, sete milhões de estudantes estarão debruçados sobre o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Será a décima quinta edição da prova, que, ao longo desses anos, foi acumulando atribuições além da função original, de avaliar o desempenho dos alunos na última etapa da educação básica. A mais recente, e polêmica, foi ter se tornado requisito obrigatório do programa Ciência Sem Fronteiras, que assegura bolsa de estudos no Exterior. Antes, a exigência era um critério de seleção. Em anúncio feito três dias antes do fim das inscrições do Enem, o Ministério da Educação (MEC) afirmou que todos os estudantes de ensino superior interessados em receber uma bolsa de estudos no Exterior precisariam ter prestado a prova pelo menos a partir de 2009 e atingido, no mínimo, 600 pontos. Com tantas aplicações – além de proporcionar a entrada na faculdade por meio do Sistema de Seleção Unificada (Sisu), o exame pode garantir o certificado de conclusão do ensino médio e conceder bolsa e financiamento do governo para o ensino superior, como no caso do Programa Universidade para Todos (Prouni) –, não é de se espantar que o Enem bata recorde de inscritos. Mas, se, por um lado, ele garante maior acesso ao ensino superior, por outro, sua supervalorização tem sido considerada uma estratégia do governo para fazer com que mais instituições optem pela adesão. Presidente do Instituto Nacional de Pesquisas e Estudos Educacionais Anísio Teixeira (Inep), Luiz Cláudio Costa rebate as críticas sobre uma possível pressão. “Aderir ao Enem é uma decisão autônoma”, afirma.

Não é o que pensam muitos integrantes de corpos docentes espalhados pelo País. “As universidades que não usam Enem são coagidas com esse tipo de medida”, diz Fernando Josepetti Fonseca, presidente da comissão de relações internacionais da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP). “Alunos nossos ficaram de fora porque não sabiam da regra.” A USP diz que não adere ao exame porque a pontuação não é divulgada a tempo para compor a nota do vestibular da Fuvest. Tal posição contraria seu Diretório Central dos Estudantes (DCE). “A USP deveria participar, porque o Enem é um meio de democratizar a educação”, diz Gabriel Lindenbach, 21 anos, um dos diretores do DCE. Outras importantes instituições brasileiras, como a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e a Universidade de Brasília (UnB) – que só entrou no Sisu neste ano –, também deixarão de mandar estudantes para o Exterior por causa da nova norma. “Na Unicamp, 16 alunos das últimas chamadas foram excluídos por causa do Enem”, afirma Laura Sterian Ward, coordenadora do Ciência sem Fronteiras na instituição.

Entre esses alunos está Lucas Ramirez, 22 anos, estudante de engenharia elétrica da Unicamp. Ele fez apenas a parte objetiva do Enem para somar pontos no vestibular, mas, sem a redação, atingiu 545 pontos – o Ciência sem Fronteiras exige pelo menos 600. “Farei o Enem no próximo final de semana porque quero tentar uma bolsa novamente”, diz. Já o gaúcho Marcos Vinícius Saturno Ribeiro, 25 anos, aluno de sistemas para internet do Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IRFS), não fez o Enem para entrar na faculdade e perdeu o prazo de inscrição da prova deste ano. “Agora só poderei viajar na pós-graduação, pois me formo no semestre que vem.” O presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Jorge Guimarães, afirma que o governo passou a exigir o Enem porque a demanda por bolsas no Exterior aumentou muito. “Precisamos agir rápido porque temos contrato com parceiros internacionais”, diz.

Como processo seletivo, o exame está consolidado. Se em 2010 havia 793.910 inscritos no Sisu disputando 47.913 vagas, em 2013 o número de interessados pulou para 1.949.958 e a quantidade de vagas subiu para 129.319. Especialistas são unânimes em afirmar que ele facilitou o acesso à faculdade. E cada vez mais instituições vêm aderindo, como a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que, neste ano, excluiu o vestibular próprio. Para se prepararem, os candidatos estudam em cursinhos especializados. Caso da estudante Mariana Almeida, 18 anos, que pretende cursar direito na UFMG. “Estou me preparando porque a prova é muito extensa”, afirma. 

Instituições particulares também entram no sistema, por meio do Prouni. Nesse caso, o resultado do Enem é um critério para distribuição de bolsas de estudo. Para Bianca Carolina Basílio Silva, 21 anos, o Prouni é o passo principal para realizar o sonho de cursar medicina. “Entrar na universidade pública, muito mais concorrida, é bem mais difícil do que conseguir uma bolsa em uma instituição particular, cuja mensalidade não posso pagar”, diz.

Mesmo que abra portas, o Enem ainda é alvo de várias críticas por acumular tantas responsabilidades. “É uma prova muito ambiciosa”, afirma Paula Louzano, especialista em educação e doutora pela universidade Harvard. “Com tantas funções, é difícil discriminar os diferentes níveis de desempenho necessários para cada objetivo. Para certificação do ensino médio, por exemplo, a nota de corte é baixa, mas quem quer entrar em um curso de medicina, por exemplo, precisa ir muito bem”, afirma a educadora. Ela explica que, se o Inep, que elabora a prova, focar em um objetivo, poderá ter falhas em outro.” 

Outra polêmica é a metodologia de correção da prova, a Teoria de Resposta ao Item (TRI), que usa modelos matemáticos para calcular a pontuação de cada candidato levando em conta seu nível de proficiência, penalizando os chutes. Com isso, dois alunos podem ter o mesmo número de acertos, mas ter pontuação diferente. “Mas, para dar certo, é necessário um banco de questões muito grande. Se o de hoje fosse ideal, não teríamos vazamento de questões, como já ocorreu”, afirma o professor da Faculdade de Educação da USP Nilson José Machado, que fez parte da equipe de criação do Enem. Já Tufi Machado Soares, do Centro de Políticas Públicas e Avaliação da Educação da Universidade Federal de Juiz de Fora, acredita que esse banco não está mais em situação insegura. O Inep não divulga o número de itens no banco, mas afirma que ele aumenta ano a ano.