fbpx

Pelos corredores das Escolas e nas manifestações por melhorias na Educação, o Ensino médio Politécnico recebeu um apelido debochado: “politreco”. O sistema em implantação na rede estadual desde o ano passado tem provocado estranheza entre Alunos e Professores, que tentam se adaptar a novos métodos de avaliação e organização curricular.

Na última quinta-feira, a reforma surgiu entre as reivindicações dos participantes do protesto que resultou na depredação da fachada do Museu Júlio de Castilhos, na Capital. As principais mudanças incluem a troca de notas por conceitos descritivos, que classificam o desempenho em provas e trabalhos como satisfatório, parcial ou restrito.

As disciplinas tradicionais foram reunidas em quatro áreas do conhecimento (linguagens, matemática, ciências da natureza e ciências humanas), e os Professores desses grupos precisam chegar a um consenso para definir o conceito do Aluno. Ao final do ano, mesmo com performance insatisfatória (restrita) em uma área, o Aluno poderá passar para a série seguinte, em um regime de progressão parcial. A possibilidade inflama Educadores, que identificam uma manobra do governo para melhorar, à força, os altos índices de reprovação e evasão.

Para discutir o andamento da reforma, Zero Hora colheu impressões no Colégio Estadual Florinda Tubino Sampaio, no bairro Petrópolis, em Porto Alegre. Prevaleceram as queixas, mas uma avaliação positiva despontou com frequência, ainda que cercada por ressalvas.

– O politécnico não é ruim, mas foi mal implantado – diz a vice-diretora Élida Martini.
– Deveriam ter feito projeto-piloto, aí poderíamos fazer melhorias antes de aplicar – sugere.

A doutora em Educação Nara Eunice Nörnberg concorda que faltou uma fase de preparação mais profunda. Um acompanhamento próximo por parte das Coordenadorias Regionais de Educação, segundo ela, também é fundamental para que todos possam dirimir dúvidas.

– Quando você quer mudar, não pode fazer essa mudança de cima para baixo. A categoria é muito resistente, subversiva. Você precisa conquistar o Professor. O magistério é muito “ver para crer”. A proposta é boa, moderna, mas precisa ser instaurada com cuidado – avalia Nara.

“Politécnico dialoga com a juventude”
A Secretaria Estadual da Educação celebra os primeiros resultados, de 2012. Maria de Guadalupe Menezes de Lima, coordenadora de Gestão do Ensino médio e Profissional da pasta, afirma que o número de repetências foi reduzido em 7% nas turmas do primeiro ano, de acordo com dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).

– Na Escola brasileira, o Aluno repete o ano quando não alcança os objetivos. A reprovação gera exclusão, desestímulo, vai calcando a ideia de fracasso. O politécnico tem currículo que dialoga com a juventude. O jovem aprende a aprender com a pesquisa. Não é passe de mágica, está em construção – diz Maria de Guadalupe.

Como é a Proposta de Ensino
Confira as principais mudanças que vêm sendo adotadas na rede estadual de Ensino- A implantação do sistema é gradativa para as três séries: o 1º ano reformulado entrou em vigor em 2012, o 2º ano está sendo implementado em 2013, e o 3º começará em 2014.

– As disciplinas tradicionais foram agrupadas em quatro grandes áreas de conhecimento: linguagens (línguas portuguesa e estrangeira, literatura, Educação física e artes), matemática, ciências da natureza (biologia, física e química) e ciências humanas (história, geografia, sociologia e filosofia).

– O novo modelo de avaliação substitui notas de zero a 10 por conceitos descritivos: Construção Satisfatória da Aprendizagem (CSA), Construção Parcial da Aprendizagem (CPA) e Construção Restrita da Aprendizagem (CRA). Os dois primeiros permitem a aprovação.

Se o estudante apresentar desempenho insatisfatório (restrito) em apenas uma área do conhecimento, poderá passar de ano, em um regime de progressão parcial. Os Professores da série seguinte serão informados de que ele precisará melhorar o aprendizado, e um plano de apoio será elaborado. Caso o Aluno receba conceito restrito em pelo menos duas áreas de conhecimento, será reprovado.

– Os conceitos passam a ser atribuídos por áreas, e não mais para cada disciplina isoladamente. Cada Aluno terá, portanto, quatro conceitos, estabelecidos a partir do consenso entre os Professores envolvidos em cada área de conhecimento.

– A carga horária foi ampliada em mais 600 horas/aula (200 a mais em cada ano). O Ensino médio Politécnico passa a ter um total de 3 mil horas/aula.

– Aproveitando a carga horária extra, os Alunos conduzem projetos de pesquisa, orientados por um Professor específico. Os chamados seminários integrados aprofundam tópicos abordados em sala de aula, em uma das quatro áreas de conhecimento.

O estudante é estimulado a se aprofundar em um tema do seu interesse. A partir de uma aula de biologia, por exemplo, ele pode optar por fazer uma pesquisa sobre sustentabilidade. O Professor que coordena o seminário orientará o trabalho em parceria com o titular da disciplina relacionada. O número de pesquisas que cada Aluno realiza por ano varia de Escola para Escola.

Fonte: Fonte: Secretaria Estadual da Educação

 

Opinião: Ideias na sala de aula

ÂNGELA RAVAZZOLO 

O Ensino médio Politécnico, desde que começou a ser discutido com a comunidade Escolar, em 2011, provocou críticas, polêmicas, discussões acaloradas de todos os lados. Agora, no segundo ano de implantação, segue sendo alvo de debates.

Em Educação, as mudanças precisam de um tempo para se consolidar e apresentar resultados, mas, ao mesmo tempo, é preciso ter claro que tudo o que acontece em sala de aula impacta diretamente o desenvolvimento daquele que é a razão de ser da Escola: o estudante. Neste caso, estamos falando de jovens inquietos, desencantados com o Ensino tradicional – cenário incômodo que termina por engrossar as estatísticas de evasão e repetência em todo o país.

Os depoimentos de estudantes e Professores reunidos nesta reportagem compõem um recorte, mesmo limitado, que pode servir de alerta para um cenário maior. No discurso daqueles que vivem o dia a dia da Escola, é possível perceber um descompasso entre ideias e práticas.

O projeto do Ensino médio Politécnico apresenta, em teoria, desafios interessantes: aproximar o Aluno da pesquisa, aumento da carga horária. Mas o que é preciso investigar, agora, é como essa proposta está sendo colocada em prática.