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Depois de implantar o sistema de cotas para negros e índios em seus cursos de graduação, as universidades públicas começam a adotar o mesmo sistema no mestrado e doutorado. É esse o caso, por exemplo, do curso de antropologia social do Museu Nacional, da UFRJ. Em 2014, ele reservará duas vagas para indígenas. Para os candidatos negros serão reservados 20% das vagas e a nota de corte será menor do que a dos demais concorrentes.

 

“Não é só fazer justiça social. É uma experiência importante para a área de antropologia, que se propõe a estudar o outro”, afirma o professor João Pacheco, subcoordenador do programa de pós-graduação do Museu Nacional. Na Universidade de Brasília, a reserva de 20% das vagas para alunos negros no mestrado e doutorado em sociologia foi aprovada em julho, mas ainda depende do aval do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão. Na Universidade do Estado da Bahia, 40% das vagas dos cursos de pós-graduação são reservadas para negros e 5% para indígenas. Apesar de ser historicamente refratária ao sistema de cotas na graduação, a USP fixou um terço das vagas de seu programa de pós-graduação em Direitos Humanos para negros, indígenas e pobres.

Embora o Ministério da Educação não imponha políticas de ação afirmativa na pós-graduação, dando às instituições de ensino superior liberdade para fazer o que julgarem mais conveniente em matéria de qualificação para pesquisa científica, as universidades públicas invocam estatísticas do IBGE para justificar a adoção de políticas afirmativas na pós-graduação. Segundo o órgão, apesar de negros e pardos representarem 51% da população, só 18,8% dos brasileiros com mestrado pertencem a esse grupo étnico. Entre os doutores, a proporção é de 14,6%. “É preciso abrir mais portas da pós-graduação para excluídos. Falta um pacto nacional para resolver o problema”, afirma o coordenador da ONG Educafro, frei David Santos.

Esse argumento, contudo, não procede. Como o sistema de pós-graduação stricto sensu foi adotado nas universidades com o objetivo de qualificar o corpo docente do ensino superior e expandir a pesquisa científica, para assegurar a inovação tecnológica no País, o acesso ao mestrado e doutorado está obrigatoriamente baseado no princípio da competência.

Em outras palavras, se a ênfase no mérito for abrandada ou relativizada em nome da “justiça social”, a pós-graduação perderá eficiência. Os mecanismos de avaliação dos mestrados e doutorados implantados nos últimos 16 anos perderão sentido. A qualidade da pesquisa científica estará em risco. E as consequências serão sofridas por toda a sociedade – inclusive pelos segmentos mais desfavorecidos. Como o País poderá adotar novas tecnologias, modernizar o parque produtivo e conquistar mais espaço no mercado internacional – medidas fundamentais para gerar novos postos de trabalho, incorporar as novas gerações na economia formal e assegurar inclusão social – sem as pesquisas científicas e os programas de qualificação acadêmica de uma pós-graduação baseados no princípio da competência? Depois da adoção das cotas nos mestrados e doutorados, quais seriam os próximos passos? Assegurar cotas de emprego em laboratórios e salas de aula para pós-graduados sem a devida qualificação?

Com a decisão de adotar políticas de ação afirmativa na pós-graduação, as universidades públicas agitam bandeiras mais vistosas do que eficazes. Prometem fazer justiça social, “democratizando” o acesso aos mestrados e doutorados. Mas se esquecem de que os problemas de injustiça social têm origem na educação fundamental e média, e não no ensino superior. O funil do ensino não está na graduação ou na pós-graduação, mas na formação deficiente no ensino básico. Se o ensino básico proporcionasse educação de qualidade, os setores mais desfavorecidos teriam a formação técnica e o preparo intelectual necessários para ingressar por mérito próprio em qualquer curso de pós-graduação.