De responder uma questão sem ler todo o enunciado a optar pela alternativa mais longa e politicamente correta: são inúmeras as técnicas e dicas para realizar a prova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) com “chutes” que circulam pela internet em vídeos que já somam milhões de visualizações no YouTube. A técnica é polêmica e divide professores. De um lado, quem repassa as “orientações politicamente incorretas para o Enem” garante que o objetivo é ensinar o aluno a fazer a prova de forma mais rápida e não desestimular o estudo. Por outro, são perda de tempo e só devem ser utilizadas para não deixar a questão em branco.
Professor de matemática, estatística, probabilidade e análise financeira, o engenheiro civil Paulo César Pereira estuda a técnica do “chute” há mais de 20 anos. Segundo ele, a técnica surgiu de forma elaborada por volta de 1990, mas os concurseiros já usavam há muito tempo e a prova de que funcionam são os sistemas antichutes que as bancas examinadoras aplicam. Em 2007, com o pedido de ajuda de uma amiga que queria passar em um concurso, ele começou a estudar o assunto mais a fundo. Acabou publicando o e-book A arte de marcar X, disponibilizado gratuitamente na internet. Não demorou muito para começar o conteúdo em seu canal de vídeos, que hoje conta com 9 milhões de visualizações.
Pereira garante que a “a arte de marcar X” funciona, mas não substitui o estudo, pois até para aprender a chutar é necessário estudar. “Tem que pegar as provas anteriores, desde 98, e resolver todas as provas. Pegar o e-book, o material didático e estudar. Tem que se cercar de conhecimento de todos os lados”, diz. Ele afirma que a técnica do “chute” aumenta a nota em 10%, porém não deve ser usada de forma exclusiva. “A ideia é justamente motivar os estudos. Estudar não é dar uma lida por cima. Tem que imprimir, encadernar e ir rabiscando o material, destrinchar a matéria, elaborar a própria apostila”, explica o professor.
Se no final da prova, o aluno não tiver conhecimento sobre o assunto, é melhor chutar do que deixar em branco
Alberto Francisco do Nascimentocoordenador de cursinho de São Paulo
Ex-conselheiro do Conselho Estadual de Educação do Rio de Janeiro e professor aposentado da UFRJ, Paulo Sampaio também tem grande audiência no canal de vídeos. Conforme Sampaio, as orientações “politicamente incorretas para o Enem” não aconselham a não estudar – “o que seria burrice”, diz -, mas fazem o aluno aprender a fazer uma prova mais rapidamente do que faz na escola. “Todos os coordenadores de cursinhos aconselham que os alunos devem treinar em provas anteriores do Enem. Só não ensinam como fazer a prova de maneira eficaz com o que conseguiram estudar”, critica.
As dicas e procedimentos de chutes não devem ser utilizados aleatoriamente, mas em situações pontuais, como quando o tempo de realização da prova está esgotando e ainda faltam questões a serem respondidas. De acordo com Sampaio, isso possibilita que a probabilidade de acerto suba de 20% para 50%. “O importante é ganhar de um a zero a final da Copa do Mundo ou dominar o adversário durante todo o jogo e perder?”, questiona. Ou seja, de que vale saber tudo sobre o assunto e não responder no tempo as questões de prova?
Professor de cursinho critica técnica
Para o coordenador de vestibular do Anglo, Alberto Francisco do Nascimento, a técnica não tem validade. “Bom professor ensina. Professor tem que ter didática e transmitir conhecimento ao aluno, não ensinar a ‘chutar’”, afirma. Ele critica a técnica e diz que o aluno tem que receber informação e conhecimento que possibilitem fazer a prova. Entretanto, Nascimento não descarta o “chute”. “Se no final da prova, o aluno não tiver conhecimento sobre o assunto, é melhor chutar do que deixar em branco”, comenta.
A prova do Enem utiliza o sistema da Teoria da Resposta ao Item (TRI), que dá valores diferentes para as questões: “O aluno que deixa questão em branco não tem vantagem, mas o que erra questão fácil e acerta uma difícil também não”, explica Nascimento. Para o coordenador do cursinho de São Paulo, os estudantes devem estudar todas as matérias e as intersecções entre elas. “Se estudar, vai desenvolver raciocínio. Se desenvolver bom raciocínio, vai bem no Enem”, garante.
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