Há três anos em tramitação, o Plano Nacional de Educação (PNE) ainda não tem previsão para ser aprovado no Congresso Nacional. Com isto, metas estratégicas para a educação brasileira correm o risco de não serem alcançadas, como, por exemplo, a que estabelece 30% de acesso ao ensino superior no país.
O PNE e a expansão do ensino superior, por sinal, serão discutidos na próxima edição do Fórum do Conselho dos Reitores das Universidades Brasileiras (Crub), que será realizado nesta quinta-feira, e sexta-feira, dias 29 e 30, no Maranhão. Para o presidente do CRUB, Wolmir Therezio Amado, já começa a preocupar a demora na tramitação do Plano Nacional, no Congresso.
“Mais do que avaliar o ritmo de expansão da educação superior no país, temos que enfrentar a questão do tempo hábil para o alcance da meta. Já não contamos mais com o decênio para a implementação das metas do Plano Nacional de Educação, uma vez que o Programa apresenta um atraso relativo de três anos. Neste cenário é possível que a meta não seja completamente atingida”, alerta o presidente do CRUB, que também é reitor da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO).
Além dos desafios ligados à meta de expansão do ensino superior a partir do Plano Nacional de Educação, reitores de todo o país debaterão, também, no fórum, temas como a reforma universitária, a expansão colaborativa, o aprimoramento dos parâmetros de avaliação e regulação do ensino e os impactos do “Programa Mais Médicos”, nas instituições de ensino superior do país.
A tendência é que relação entre as universidades e o MEC também esteja em pauta. Até porque, há menos de dois meses, o CRUB divulgou uma carta aberta na qual cobrava, entre outras coisas, “uma disposição menos punitiva, mais dialogal, mais solidária aos que diuturnamente trabalham na árdua e desafiante missão de educar.” Segundo Wolmir Therezio Amado, há uma preocupação com os dirigentes das universidades com os efeitos sistêmicos das políticas e das estratégias adotadas pelo poder público. Ele ressaltou que é preciso analisar as especificidades do segmento do ensino superior no país pois, pela complexidade do sistema, medidas adequadas para um determinado setor podem ter efeitos distintos quando aplicadas, sem ajuste, em outra parte do sistema.
“Há significativas diferenças regionais, que marcam e determinam a atuação das Instituições de ensino superior. Não resta dúvida que os desafios de quem atua, por exemplo, na região Sudeste, são distintos dos desafios de quem está na região Norte”, destaca o presidente do CRUB.
FOLHA DIRIGIDA — Nesta quinta e sexta-feira, dias 29 e 30 de agosto, será realizada mais uma edição do Fórum de Reitores do CRUB, com o tema “Plano Nacional de Educação: Expansão da Educação Superior com Qualidade – Desafios e Perspectivas”. A seu ver, quais os principais desafios para a ampliação do acesso ao nível superior dentro dos padrões que o Brasil precisa para se desenvolver?
Wolmir Therezio Amado — Creio que devemos, com urgência, refletir mais sobre os desafios da educação superior, antes de, propriamente, abordar o tema da ampliação do acesso. Nosso ponto de partida é o gargalo que existe na educação básica, principalmente, do ensino médio. A qualidade neste setor está aquém dos padrões desejáveis, tornando-se um dos fatores que dificultam o acesso à educação superior. O problema hoje não é principalmente a falta de vagas, e sim sua distribuição, uma vez que temos vagas ociosas em todo o Sistema Nacional de Educação Superior. O desafio consiste em elaborar estratégias eficientes e eficazes para promover a ocupação dessas vagas e, em seguida, garantir a permanência dos estudantes até a conclusão do processo formativo. Outros pontos críticos, que devemos ponderar com cuidado e urgência, são: a formação de professores para a educação básica, a valorização da carreira do magistério e o investimento em pesquisa e inovação, com a formação de mais mestres e doutores. Necessitamos de um maior comprometimento e engajamento de todos – governos, instituições de ensino e sociedade civil – para uma educação de qualidade no país.
O Plano Nacional de Educação estabelece uma meta de 30% de jovens de 17 a 25 anos com ensino superior completo até 2022. Com o ritmo de expansão atual, acredita que é possível atingir esta meta? O que fazer para alcançar este objetivo?
Mais do que avaliar o ritmo de expansão da educação superior no país, temos que enfrentar a questão do tempo hábil para o alcance da meta. Já não contamos mais com o decênio para a implementação das metas do PNE, uma vez que o Programa apresenta um atraso relativo de três anos. Neste cenário é possível que a meta não seja completamente atingida.
Quais questões do ensino superior o senhor espera que sejam levantadas e debatidas, neste fórum, a partir desta temática principal?
O CRUB, atento às demandas e aos desafios do ensino superior, propõe em seu Fórum um rico debate sobre a questão da qualidade da educação superior e as formas para alcançá-la, tendo como norte o PNE 2010/2020. Pretendemos, ainda, que temas como a reforma universitária, a expansão colaborativa, o aprimoramento dos parâmetros de avaliação e regulação do ensino e os impactos do “Programa Mais Médicos” sejam trabalhados a fundo pelo conjunto de reitores e autoridades, que lá estarão presentes.
Em julho deste ano, o CRUB divulgou um manifesto no qual, entre outras posições, colocava que os reitores almejavam “um novo momento nacional para a condução da Educação Brasileira, com uma disposição menos punitiva, mais dialogal, mais solidária aos que diuturnamente trabalham na árdua e desafiante missão de educar.” A postura do MEC, frente às instituições de ensino, tem sido em uma mais punitiva? Por que?
O Conselho de Reitores, como legítimo representante e aglutinador de todos os segmentos que integram o Sistema Nacional de Educação Superior, está preocupado com os efeitos sistêmicos das políticas e das estratégias adotadas em todas as instâncias envolvidas. Pela complexidade do sistema, medidas razoáveis para um determinado setor podem ter efeitos distintos quando aplicadas, sem nenhum ajuste ou adequa
ção, em outro setor do sistema. Os atores da educação superior têm natureza e condições de operação muito distintas, embora todos cooperem para a implementação do Plano Nacional. Mais ainda: há significativas diferenças regionais, que marcam e determinam a atuação das Instituições de ensino superior. Não resta dúvida que os desafios de quem atua, por exemplo, na região Sudeste, são distintos dos desafios de quem está na região Norte. Por isso, o CRUB entende que o diálogo e o respeito às reais e específicas condições de atuação são essenciais para o sucesso das políticas nacionais. Quando afirmamos que necessitamos “de uma disposição menos punitiva”, queremos reforçar a urgência de que todas as instituições envolvidas no processo educacional sejam tratadas de forma equânime, de maneira condizente com o disposto na legislação brasileira e com suas reais condições de inserção no sistema, por meio do aperfeiçoamento dos critérios de avaliação institucional e acadêmica, estimulando proativamente a busca pela excelência.
No mesmo manifesto, é dito que os reitores querem que “as Instituições de Educação Superior sejam consideradas em sua diversidade de natureza jurídica, em sua condição de viabilidade, em sua liderança e contribuição regional”. O senhor considera que os parâmetros de avaliação das universidades, atualmente, são injustos? Por que?
Na realidade temos um bom sistema de avaliação, graças aos esforços permanentes de adequação e aperfeiçoamento. Neste ano, em que o Sinaes completa uma década, por exemplo, foi feita uma meta-avaliação do sistema. As universidades, o CRUB e as demais entidades foram consultadas para identificar possíveis melhorias nos parâmetros de avaliação. Como resultado deste processo, esperamos que seja possível contar com ferramentas mais consistentes e sensíveis à complexidade do sistema de Ensino Superior para os próximos anos. Considerando retrospectivamente a história da avaliação no ensino superior brasileiro, observamos uma considerável evolução. Muitos passos foram dados, desde os primeiros projetos de avaliação institucional, induzidos pelo Paiub, até o sistema que possuímos hoje, o Sinaes, instituído pela Lei nº 10.861/04.
Como analisa o sistema de avaliação do ensino superior no Brasil? Seus resultados refletem, realmente, a qualidade do trabalho das instituições de ensino? Ou há distorções?
As distorções podem acontecer em qualquer sistema de avaliação. O importante é que sejam detectadas precocemente, pois é a partir delas que podemos identificar falhas e deficiências para aprimorar e melhorar o sistema. O que necessitamos, neste momento, é que o sistema consiga levar em conta as assimetrias regionais e estruturais que caracterizam as instituições de ensino superior no Brasil.
O ensino superior privado vive uma nova fase de expansão, a partir da criação de instituições que formam grandes conglomerados. Esta tendência de concentração em um setor tão estratégico pode trazer problemas para o país?
A questão remete, necessariamente, à problemática das vagas ociosas e de sua distribuição em relação ao mapa da distribuição regional dos egressos do ensino médio. O segundo aspecto decisivo, neste cenário, é o compromisso com a qualidade do ensino, uma vez que essas instituições devem contribuir de forma agregadora para a busca da excelência do ensino superior do país.
Já é o momento de o governo federal estabelecer restrições às fusões no segmento da educação superior? Ou é o mercado que tem de regular? Por que?
Na verdade esta é uma questão mais da ordem das políticas econômicas que propriamente educacionais. A regulação destas operações compete ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), que tem a missão de zelar pela livre concorrência, inclusive neste setor do mercado, e fomentar e disseminar a cultura da livre concorrência.
As matrículas no ensino a distância no Brasil cresceram de pouco mais de 30 mil, em 2000, para quase 1 milhão de alunos. E a maioria delas está na educação superior privada. Como vê esse fenômeno? O ensino a distância cresce com a qualidade necessária? Ou é preciso regulação?
O ensino a distância é uma ferramenta fundamental para o acesso de estudantes ao ensino superior, uma vez que, com as redes digitais, as fronteiras dentro do país podem ser facilmente superadas. O EAD atinge uma população que, muitas vezes, se encontra à margem do sistema educacional, devido ao seu poder de penetração em regiões remotas, exercendo um importante papel social. A regulação para o setor está em vias de efetivação. O delineamento das diretrizes da EAD contribuirá para potencializar as capacidades formativas, acadêmicas e inclusivas desta modalidade de ensino.
O governo federal quer chegar a um cenário de 40% de oferta de vagas. É válida uma expansão pela via do ensino público ou o mais adequado é aproveitar a capacidade ociosa do setor privado e cobrar qualidade?
A expansão ideal é realizada por vias colaborativas, na qual ocorra o engajamento de todos os atores envolvidos no processo educacional, tanto públicos como privados, buscando o uso racional dos recursos disponíveis, por um lado, e o respeito dos princípios indissociáveis do ensino, pesquisa e extensão, como critérios de qualidade institucional. Isto é, precisamos elaborar e sustentar uma visão sistêmica do conceito de expansão, envolvendo todos os setores de maneira integrada e equilibrada.
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