Há sinais de que se alarga o espaço para objetividade no sensível debate sobre cotas em universidades públicas, como mostrou reportagem de Érica Fraga, nesta Folha, sobre notas obtidas por cotistas.
Instituições oficiais de ensino superior consomem verbas públicas para formar recursos humanos de qualidade. A seleção com base no mérito acadêmico, medido pelo vestibular, era a forma usual de escolher os jovens privilegiados com esse investimento social.
Como os melhores alunos do ensino médio no Brasil costumam sair de escolas particulares, o vestibular e as faculdades públicas tornaram-se um mecanismo reprodutor de vantagens sociais.
Surgiu então a pressão, fora e dentro da universidade, para torná-la socialmente mais diversa e inclusiva. Um movimento legítimo, mas infelizmente distorcido pelo viés de raça, importado dos EUA.
O critério racial para cotas padece de dificuldades éticas e práticas insuperáveis, como inscrever a discriminação (ainda que bem-intencionada) em lei e ter de arbitrar a raça dos muitos mestiços brasileiros. Por tal razão, este jornal advoga cotas sociais, como bônus para estudantes oriundos de escolas públicas, no pressuposto de que o critério favorecerá de modo automático os mais pobres e os integrantes de contingentes étnicos.
Como promove a inclusão de alunos mais despreparados, era de prever que o sistema redundasse em menor rendimento acadêmico de sua parte no curso universitário.
Foi precisamente o resultado encontrado por Fábio Waltenberg e Márcia de Carvalho, da Universidade Federal Fluminense, com base no Enade (Exame Nacional de Desempenho de Estudantes) de 2008. As notas de 167.704 alunos que concluíam a graduação revelaram que os cotistas tiveram avaliações 9% a 10% menores que não cotistas, dependendo da instituição.
Salta aos olhos que a defasagem não seja muito significativa. Para comparação, basta mencionar que estudantes do sexo feminino costumam ter notas 10% superiores às de colegas masculinos.
Outro estudo, com egressos da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (pioneira na introdução de cotas), encontrou diferencial similar (8,5%) e uma tendência surpreendente: mais cotistas (47%) se formam do que não cotistas (42%).
Essas pesquisas, ainda preliminares, sugerem que as cotas não ocasionam o desastre acadêmico previsto, de um lado, e talvez até melhorem a eficiência do gasto público (diminuindo a evasão).
Montar um sistema de acompanhamento meticuloso dessas variáveis é crucial para o governo federal revisar periodicamente o experimento social das cotas.
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