Nos últimos 30 anos, o índice de mortes de crianças e adolescentes por conta de acidentes de transporte também aumentou, embora esteja abaixo do ápice registrado em 1996. Em 1980, houve 8,1 mortes para cada 100 mil crianças e adolescentes. Chegou a 10,3 em 1996, caindo para 7,2 em 2006, mas voltando a crescer desde então. Em 2010, foram 8,7 óbitos por 100 mil crianças e adolescentes. Na comparação com outros 101 países, o Brasil apresentou a 12ª maior taxa do mundo.
Para o autor do estudo, o pesquisador Julio Jacobo Waiselfisz, a queda a partir de 1997 se explica pela adoção, naquele ano, do Código de Trânsito, “que penalizou de forma mais rígida as diversas infrações no trânsito”. O estudo continua: “Sob o impacto do novo código, as taxas caíram de forma significativa nos primeiros anos, o que durou até 2000. A partir dessa data os índices se estabilizam, mas começam a crescer novamente a partir de 2008, perdendo-se assim muitos dos avanços quantitativos registrados nos primeiros anos de vigência da norma”. Para ele, parte da explicação desse recrudescimento está no aumento da frota de motocicletas.
“Há fácil acesso à motocicleta. Há problema de educação: praticamente qualquer um faz uma prova num pátio fechado, e se conseguir se manter em cima da motocicleta sem cair tem a carteira. E praticamente não temos fiscalização de motocicleta. Nossos sistemas eletrônicos praticamente não pegam a motocicleta. Temos uma série de problemas que não estão sendo solucionados porque não há interesse de coibir muito o avanço das vendas de motocicletas”, afirmou.
Com a queda acentuada nas mortes com causas não violentas (problemas de saúde), o peso relativo das mortes provocadas por acidentes de transporte só cresceu. Em 1980, foram responsáveis por 2% de todos os óbitos de crianças e adolescentes no Brasil. Passou para 4,1% em 1990, 4,7% em 2000 e 7,2% em 2010. De 1981 a 2010, 169.512 crianças e adolescentes morreram em acidentes de transporte em todo o país. Mas esse avanço foi desigual. De 2000 a 2010, aumentou entre os mais novos (0 a 1 ano) e os mais velhos (14 a 19 anos), mas diminuiu na faixa intermediária.
Por estado, também há grandes diferenças. O Paraná, que costuma aparecer entre os estados com mais mortes nos balanços divulgados pela Polícia Rodoviária Federal (PRF), apresentou o maior índice entre crianças e adolescentes: 15 óbitos para cada 100 mil. Em seguida vêm Rondônia e Mato Grosso, com taxa de 14,1 cada. O Rio de Janeiro possui o terceiro menor índice — 6,2 por 100 mil — atrás apenas de Amazonas e Acre.
Na comparação entre 2000 e 2010, quem se saiu melhor foi Roraima, com uma queda de 35,9% no índice, passando de 13,5 para 8,7 óbitos provocados por acidentes de transporte para cada grupo de 100 mil crianças e adolescentes. O Maranhão, por outro lado, teve o maior crescimento: saltou de 2,9 óbitos por 100 mil para 6,7, um avanço de 128,8% em dez anos.
No quesito outros acidentes — que inclui, por exemplo, quedas, afogamento, choques elétricos, exposição ao fogo ou fumaça e fenômenos naturais — o estado com maior taxa de óbitos é o Tocantins: 11,8 mortes por grupo de 100 mil crianças e adolescentes em 2010. A Paraíba ocupa a outra ponta da tabela, com índice de 4,2 por 100 mil. Em todo o Brasil, houve um recuo na taxa de mortes na categoria “outros acidentes”: eram 10,7 por 100 mil em 1980, caindo para 6,3 em 2010. Entre 102 países, o Brasil apresentou o 38º maior índice. Somente sete estados não seguiram a tendência nacional e viram esse tipo de morte subir entre 2000 e 2010: Rio de Janeiro, Tocantins, Maranhão, Pará, Alagoas, Piauí e Mato Grosso do Sul.
Na comparação internacional, o Brasil se sai melhor nos suicídios. Numa lista de 99 países, o Brasil é o 60º, com uma taxa de 1,1 óbito para cada 100 mil crianças e adolescentes. Na primeira colocação está um vizinho do Brasil, a Guiana, com índice igual a 10,1 por 100 mil. Mas o relatório destaca o crescimento nas últimas três décadas: a taxa era de 0,8 por 100 mil em 1980. Também há um índice elevado entre os adolescentes mais velhos: chega a 4,4 por 100 mil aos 18 anos e a 5,5 aos 19 anos. O crescimento foi mais significativo no Nordeste, em especial na Paraíba e Piauí. O estado com maior taxa de suicído em 2010 foi o Mato Grosso do Sul — 4,3 por 100 mil — e menor taxa foi observada no Rio Grande do Norte: 0,4 por 100 mil.
A pesquisa também analisou os atendimentos feitos no Sistema Único de Saúde (SUS) em casos de crianças e adolescentes vítimas de violência doméstica e sexual. Em 2011, segundo o Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) do Ministério da Saúde, prevaleceram os atendimentos em decorrência da violência física, com 40,5% do total. Em segundo lugar vem a violência sexual, com 20%, seguida de violência psicológica ou moral (17% dos casos) e negligência ou abandono (16%).
O estudo conclui que há um claro contraste entre as mortes violentas e os atendimentos no SUS. Enquanto no primeiro caso, em torno de 80% das vítimas são meninos, nos atendimentos do SUS 60% são meninas.
“A violência letal afeta mais o menino, que é uma questão mais masculina sair armado, ter uma arma de fogo, entrar em brigas, etc, ou se expor a esse tipo de questões; enquanto a violência não letal no mundo todo afeta mais as meninas. E a maior parte da violência sexual é sobre meninas e não sobre meninos”, explicou Waiselfisz.
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