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Há exatos dois meses, uma estudante de 14 anos levou uma pistola para dentro do Colégio Estadual Amazor Vieira Borges, em Austin, Nova Iguaçu. A arma (descarregada) foi emprestada por um vizinho, de 18. O episódio não teve maiores consequências, ninguém ficou ferido, mas é assustador por revelar a fragilidade da segurança nos colégios, a facilidade do acesso de adolescentes a armas de fogo e, pior, seu fascínio por elas:

 – A estudante alegou que gostava de armas e que queria mostrar a pistola para as amigas do colégio – disse, na época, um policial chamado à escola.
 
O episódio de Austin não é isolado. Diretores de 1.427 escolas públicas brasileiras relataram ter visto pessoas armadas dentro do colégio, em 2007, segundo levantamento feito pela Megazine a partir das respostas dadas ao questionário aplicado na Prova Brasil daquele ano.

– O que as armas de fogo representam? Força, poder e masculinidade. É um símbolo forte. Meninos e meninas não andam armados para matar alguém, necessariamente. Eles fazem isso para mostrar que estão armados – explica a coordenadora da área de Juventude e Políticas Públicas da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais, Miriam Abramovay, completando: – Por mais que a intenção seja não usar, tragédias acontecem. Quando fazemos pesquisas, a maioria esmagadora diz que já viu armas de fogo. E diz-se que comprá-las é mais fácil do que comprar pão.

Um caso ocorrido há dez dias numa festa junina, em Botafogo, bairro de classe média carioca, confirma as palavras dela. Rodrigo Paiva Freitas, de 20 anos, atirou em um adolescente de 17 e justificou o crime dizendo que comprou a arma para se defender, após ter apanhado do rapaz – sua futura vítima – e de amigos dele em outra festa.

Em maio, a situação também saiu do controle para o adolescente Y., de 17 anos, que assassinou, com quatro tiros, um vizinho de 31 em Pirajá, subúrbio de Salvador. A arma foi comprada por R$400, na Feira de São Joaquim, conhecida como “Feira do Rolo”.

 – Matei porque ele ficava me tirando (paquerando) – “justificou”, na época, o assassino.

A promotora Eliane de Lima, da Vara da Infância e Juventude do Rio, explica que o adolescente não precisa de um motivo para portar uma arma:

– O jovem tem a necessidade de se afirmar. Levar uma arma para escola oupara o baile é uma forma de ostentação, mostrar que está com a letalidade nas mãos.

Uma longa lista de estatísticas mostra a dimensão do problema. Na região metropolitana de Belo Horizonte, 5% dos estudantes de escolas públicas e particulares afirmaram já ter levado ou tentado levar armas de fogo para a escola, segundo pesquisa do Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública da UFMG, de 2005. No Distrito Federal, de acordo com estudo de 2008, 20,5% dos alunos, ou 37.921 adolescentes, disseram ter visto alguém armado dentro da colégio. Na região metropolitana de Maceió, 15% das armas
apreendidas em 2010 estavam com menores de 11 a 15 anos.

No país, 79,5% dos homicídios de jovens foram provocados por armas de fogo. O indicador é do Mapa da Violência de 2011, referente a dados de 2008.

– Se você fizer um levantamento desde 1980, o único segmento da população em que os homicídios cresceram foi na faixa etária entre 15 e 24 anos. Com o aumento da violência, está havendo um extermínio da juventude – resume Julio Jacobo Waiselfisz , autor do mapa.

Enquanto não se acha solução definitiva, campanhas de desarmamento funcionam. Waiselfisz constatou que, em 2004, na grande mobilização pelo desarmamento, o número de homicídios diminuiu no país.

Já na campanha lançada em maio passado, 10 mil armas foram entregues. Mas Antônio Rangel, coordenador de desarmamento do Viva Rio, crê que o controle sobre a venda precisa melhorar.

– Temos uma das leis mais restritivas do mundo, mas é tão fácil comprar aqui quanto nos EUA, onde a legislação é liberal. O que falta é fiscalização. Por isso que o Wellington (Menezes Oliveira) conseguiu comprar armas e matar doze crianças – diz Rangel, lembrando o massacre da Escola Tasso da Silveira, em abril, em Realengo.