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O faturamento das instituições particulares de ensino superior cresceu 30% em dois anos, segundo estudo feito pela Hoper, consultoria especializada na área. O valor de R$ 24,7 bilhões em 2011 subiu para R$ 32 bilhões em 2013, segundo estimativa para esse ano. As recentes fusões e aquisições de faculdades e universidades criaram gigantes no setor e contribuíram para o crescimento do negócio que atinge 5 milhões de alunos no país.

De acordo com o Censo de Educação Superior do Ministério da Educação, o país tem 6,7 milhões de estudantes universitários: 73,7% deles estão nas instituições particulares e 26,3% nas públicas.

Um grupo de 13 grandes conglomerados tem 36,2% de participação deste mercado de instituições privadas, segundo o levantamento da Hoper. Este grupo seleto reúne 1,8 milhão de estudantes, o que corresponde a 37,6% do total de estudantes de faculdades particulares e cerca de 28% do total de alunos do ensino superior de todo o país.

Em abril, o mercado foi agitado pela fusão entre a Kroton e a Anhanguera, que está sendo avaliada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Se o negócio for autorizado vai criar um conglomerado com mais de 1 milhão de alunos. Juntas, as duas instituições têm 16,2% de participação de mercado. Entre as instituições que integram a rede Kroton estão Universidade Norte do Paraná (Unopar), Faculdades Pitágoras, Unic (Universidade de Cuiabá), Unime (Universidade Metropolitana de Educação e Cultura) e Uniasselvi. Já a rede Anhanguera é dona da Universidade Bandeirante de São Paulo (Uniban) desde 2011.

 Nesta sexta-feira (23) o complexo educacional Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU) anunciou associação com o grupo Laureate International Universities, que controa, entre outros, a Anhembi Morumbi, em um negócio avaliado em R$ 1 bilhão.

Além deles, outros grandes grupos de educação se destacam: Estáciox, Unip, Unicsul, Uninove, além da Abril Educação, que incorporou os sistemas de ensino Anglo, pH e SER, a rede Escolas Técnicas do Brasil, o Centro Educacional Sigma e as rede de escolas de inglês Red Balloon e Livemocha.

Faturamento do mercado de graduação privado (presencial + EaD) no Brasil

Graduação 2011 2012 2013
Segmento Matrículas Faturamento Matrículas Faturamento Matrículas Faturamento
Presencial 3,76 milhões R$ 22,58 bilhões 3,98 milhões R$ 25,72 blhões 4,15 milhões R$ 29,28 bilhões
Ensino a distância (EaD) 0,67 milhões R$ 2,18 bilhões 0,74 milhões R$ 2,71 bilhões 0,81 milhões R$ 2,75 bilhões
TOTAL GERAL 4,43 milhões R$ 24,7 bilhões 4,72 milhões R$ 28,3 bilhões 4,96 milhões R$ 32 bilhões
Fonte: Hoper Estudos de Mercado 2013

Em comum, estes gigantes do setor têm o grande número de alunos, a abrangência em várias unidades e municípios e a possibilidade de cobrar mensalidades mais baratas para atingir o público das classes C e D, principalmente os estudantes que não conseguem acesso às universidades públicas e querem a o diploma como forma de ascensão social e profissional.

Segundo especialistas ouvidos pelo G1, a tendência é que novas fusões e aquisições de pequenas faculdades por grandes grupos de ensino aconteçam nos próximos anos. Isto porque o setor dos grandes grupos de ensino privado encara uma demanda reprimida de alunos em busca de um lugar no ensino superior. O mercado ainda tem muito a crescer.

Para especialistas em educação, no entanto, a transformação do ensino em negócio acende o sinal de alerta para a qualidade do ensino que está sendo oferecido em busca do lucro e reforça a necessidade de o Ministério da Educação estabelecer um controle rígido de qualidade dos cursos destas instituições.

Veja o faturamento do ensino superior no Brasil
INSTITUIÇÃO Nº de alunos Receita líquida Participação de mercado Instituições integrantes
Anhanguera* 459 mil R$ 1,60 bilhão 8,3% Anhanguera, Uniban, Rede LFG
Kroton* 500 mil R$ 1,40 bilhão 7,9% Universidade Norte do Paraná (Unopar), Faculdades Pitágoras, Unic (Universidade de Cuiabá), Unime (Universidade Metropolitana de Educação e Cultura), Fama, Fais, Faculdade União e Uniasselvi
Estácio 272 mil R$ 1,38 bilhão 5,3% Universidade Estácio de Sá, Faculdade Seama, Uniradial, Idez, Uniuol, Faculdade de Tecnologia Estácio, entre outras
Unip 238 mil R$ 1,37 bilhão 4,6% Unip, Colégios Objetivo
Laureate 145 mil R$ 956 milhões 2,8% Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU). BSP – Business School São Paulo; CEDEPE Business School; Centro Universitário do Norte (UniNorte); Centro Universitário IBMR; Centro Universitário Ritter dos Reis (UniRitter); Faculdade de Desenvolvimento do Rio Grande do Sul (FADERGS); Faculdade dos Guararapes (FG); Faculdade Internacional da Paraíba (UNPB); Universidade Anhembi Morumbi; Universidade Potiguar (UnP); e Universidade Salvador (UNIFACS).
Uninove 127 mil R$ 562 milhões 2,5% Uninove
Unicsul 47 mil R$ 487 milhões 0,9% Universidade Cruzeiro do Sul e Unicid
Ânima educação 42 mil R$ 400 milhões 0,8% Centro Universitário Una, Unimonte e UniBH
Whitney 37 mil R$ 312 milhões 0,7% Universidade Veiga de Almeida e Centro Universitário Jorge Amado
Ser Educacional 49 mil R$ 282 milhões 0,9% Uninassau, Faculdade Maurício de Nassau, Faculdade Joaquim Nabuco, Escola Técnica Joaquim Nabuco, Escola Técnica Mauricio de Nassau
Grupo Tiradentes 37 mil R$ 197 milhões 0,7% Universidade Tiradentes (Unit), Faculdade Integrada Tiradentes (Fits) e Faculdade Integrada de Pernambuco (Facipe)
Devry 27 mil R$ 180 milhões 0,5% Faculdade Área1, Faculdade Fanor, Faculdade do Vale do Ipojuca (Favip), Faculdade Boa Viagem, Faculdade Ruy Barbosa
Ibmec 9 mil R$ 170 milhões 0,2% Ibmec
Outras instituições 3,3 milhões R$ 18,9 bilhões 63,8%  
TOTAL DO SETOR PRIVADO 5,16 milhões R$ 28,2 bilhões 100%  
Fonte: Hoper Estudos de Mercado (2012)
* Anhanguera e Kroton anunciaram fusão e aguardam aprovação do Cade

5,1 milhões de alunos
Termos do mercado financeiro como faturamento, IPO, ebtida, ganho de escala, fundo deprivate equity e poder de barganha dominam os diálogos de quem cuida da gestão de métodos de ensino, propostas pedagógicas e corpo docente destes conglomerados. Segundo estudo da Hoper, o setor tem 2.081 instituições de ensino pertencentes a pouco mais de 1.400 empresas (mantenedoras), que dividem um bolo de quase 5,1 milhões de alunos (contando com o ensino a distância), sendo que atualmente as 13 principais empresas concentram 38% dos alunos no ensino superior privado. Essas mesmas 13 empresas detêm um terço do faturamento do mercado de educação superior.

O estudo da Hoper indica que até 2016 o setor estará dominado por 11 grupos educacionais e vai concentrar 50% dos alunos matriculados. “É um mercado com demanda reprimida e que deve crescer nos próximos anos”, afirma Paulo Presse, um dos consultores que elaboraram o estudo.

Luis Motta, sócio em fusões e aquisições da KPMG no Brasil, lembra que no ano passado foram registradas 19 associações de empresas de educação no país. Este ano, até agora, já foram 12. “Ensino superior vem passando por processo de consolidação desde 2007 quando empresas foram para o mercado para ter ganho de escala, padronização e maior profissionalização do setor. Começaram a formar grandes grupos no Brasil e passa a atrair a atenção de investidores estrangeiros.”

O princípio do negócio é bem claro: com as fusões, os grupos ganham maior número de alunos, têm faculdades e escolas em vários cantos do país e, com isso, ganham maior poder de barganha para negociar com fornecedores (livros, material didático, equipamentos); ter uma estrutura administrativa mais enxuta; padronizar os currículos para criar um sistema único de ensino, o que gera economia de escala; ter mais agressividade no mercado e mais dinheiro para expandir os negócios. Além disso, as instituições oferecem cursos a distância ou semipresenciais, onde o aluno vai apenas alguns dias da semana na faculdade, o que diminui o investimento com professor em sala de aula. “O investidor quer retorno financeiro. É um negócio”, afirma Motta.

Mensalidades
E o estudante, como fica? O consultor de economia diz que com este volume de alunos os grandes grupos conseguem baixar o preço das mensalidades, e o estudante ganha opções de ensino a distância oferecido por estar instituições. Pode ainda mudar de cidade e seguir sob o mesmo método de ensino. As faculdades pequenas não conseguem competir e a tendência é serem absorvidas. “A concorrência vai ficar por conta das grandes instituições”, diz Motta.

Para o professor Ocimar Munhoz Alavarse, da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), o crescimento dos grandes grupos privados de educação reforça a necessidade de uma fiscalização maior sobre a qualidade do ensino oferecido. “Como garantir a qualidade dessa educação superior?”, questiona. Para ele, um ensino de boa qualidade pressupõe as condições de trabalho do professor. “Até outro dia o professor universitário era a elite da classe docente. Agora ele tem as condições de trabalho vilipendiadas, sobrecarga de aulas, grava uma aula que é transmitida para várias unidades, tem aumento de turmas e de alunos por classe.”

Celso Napolitano, presidente da Federação dos Professores do Estado de São Paulo (Fepesp), diz que, para as empresas mantenedoras, o negócio em educação é lucro garantido. “A educação superior está se transformando em um bom negócio, na medida em que o negociante mantenedor tem aluno cativo por quatro anos e tem receita certa, já que a maioria das matrículas está sendo feita pelo Fies (sistema de financiamento feito pelo Ministério da Educação, no qual o governo paga a faculdade e o aluno tem 18 meses para começar a devolver o dinheiro investido a longo prazo), ou pelo Prouni (bolsa de estudos do governo cujo valor a universidade pode abater dos seus impostos)”, diz Napolitano. “É uma espécie de capitalismo sem risco. Depois vamos ver se a conta será paga no futuro.”

Napolitano questiona a padronização do ensino. “Um grupo de universidades tem escola em Jaboatão de Guararapes, Porto Alegre, Feira de Santana e Manaus. Será que as condições do ensino e as necessidades dos alunos de cada localidade são as mesmas? O currículo deveria ser adaptado a cada região”, afirma. Ele lembra ainda que estudantes e professores têm menos opções de escolha para estudar ou dar aulas com a formação dos grandes conglomerados.

Alavarse e Napolitano destacam a necessidade de o MEC fazer um controle rigoroso de avaliação. “Como controlar esses cursos? A instituição pode estar enganando o jovem. Depois de formado ele consegue trabalhar com a profissão que estudou? Pode gerar alguém que embora titulado não tenha condições para exercer a profissão. Cabe ao MEC fiscalizar”, diz Alavarse.

“A educação é um dos elementos que garante a soberania do país. Estes fundos de investimento têm um número tão grande de jovens nas mãos que podem educá-los da maneira que quiserem. O cidadão deveria aproveitar a universidade para questionar, discutir e ampliar os horizontes”, reforça Napolitano.

Acesso às classes C e D
Roberto Valério, presidente do grupo Anhanguera, destaca que a empresa tem como missão “oferecer educação superior para um grupo de pessoas que não tinha acesso, democratizar o ensino superior e ajudar o aluno no seu projeto de vida”. A Anhanguera está presente em todos os estados brasileiros, com aproximadamente 459 mil alunos, em 70 campi e mais de 500 unidades de educação a distância, incluindo a Rede LFG, curso preparatório para concursos públicos e Exame da OAB.

Segundo Valério, a universidade oferece desde oficinas de aprendizagem gratuitas das disciplinas do ensino médio como português, biologia e matemática, assistência profissional e cursos profissionalizantes. “Nosso professor ensina o aluno a aprender.”

Anhanguera associou-se em abril com a Kroton (veja no vídeo acima), que tem mais 500 mil alunos em 53 campi localizados em 10 estados do Brasil e em 39 municípios, além de 447 polos ativos de graduação de educação a distância. Além disso, atende cerca de 289 mil alunos na educação básica, com 810 escolas associadas em todos os estados do Brasil. A fusão ainda precisa de aprovação do Cade.

O volume de alunos com Fies na Anhanguera atingiu 100 mil em junho deste ano, o que representa uma alta de 65% em relação a dezembro de 2012. A Anhanguera registrou no segundo trimestre lucro líquido de R$ 34,1 milhões, o que representa um crescimento de 38,9% quando comparado a um ano antes, segundo balanço divulgado no dia 14. “Fazemos uma gestão para ter qualidade no ensino a um custo baixo”, afirma Valério, destacando que a mensalidade média dos cursos da Anhanguera é de R$ 400.

Na entrevista em que anunciou a associação com a Laureate, o vice-reitor executivo da FMU, Arthur Sperandéo de Macedo, disse que a universidade tem banco de estágios e empregos que proporciona o acesso ao seu aluno a 4 mil vagas de emprego.

Para ele, a educação brasileira ainda engatinha. “Ainda temos potencial de crescimento no ensino superior. Apenas 14% dos jovens chegam às universidades. Se o país quer ser uma nação desenvolvida precisa ter pelo menos 50% dos jovens no ensino superior.” Ele destacou que a FMU tem 15% dos alunos com apoio do Fies e considera o financiamento fundamental para o acesso dos jovens à universidade. “O ensino superior privado deve ser elogiado porque é o grande agente desta transformação que está promovendo centenas de milhares de jovens à formação superior que vai fazer uma diferença monumental daqui a 20 anos”, afirma.

MEC quer autarquia para fiscalizar
Procurado pelo G1, o MEC destacou que tem elementos para uma avaliação criteriosa dos cursos oferecidos com a aplicação do Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade), que integra o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes), e tem o objetivo de aferir o rendimento dos alunos dos cursos de graduação em relação aos conteúdos programáticos, suas habilidades e competências.

A nota do Enade ajuda a compor o Índice Geral de Cursos e o Conceito Geral de Cursos. Uma instituição precisa ter nota acima de 3 para poder ser credenciada a oferecer bolsas de estudos pelo Prouni e receber alunos financiados pelo Fies. Na quinta-feira (22), a presidente Dilma Rousseff participou de cerimônia em São Paulo para comemorar a marca de mais de 1 milhão de estudantes atendidos pelo Fies. “As pessoas estão buscando e estão tendo a oportunidade de conseguir uma situação melhor no mercado de trabalho”, disse Dilma.

O MEC diz ainda que está em tramitação no Congresso Nacional o projeto de lei que cria o  Instituto Nacional de Supervisão e Avaliação da Educação Superior (Insaes), uma autarquia do ministério que terá  por finalidade supervisionar e avaliar instituições de educação superior e cursos de educação superior no sistema federal de ensino, e certificar entidades beneficentes que atuem na área de educação superior e básica.