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Quem não consegue distinguir a democracia da ditadura acaba escolhendo a ditadura como se fosse democracia e a democracia como se fosse ditadura.

 

Só assim se entende que a psicanalista Maria Rita Kehl associe o democrata Geraldo Alckmin, eleito com 11,5 milhões de votos, a um regime de força, como o fez em seu artigo publicado na última “Ilustríssima” (“O veredicto de Geraldo Alckmin”), com chamada de capa neste jornal.

 

Kehl comparou a ação da Polícia Militar de São Paulo contra um grupo de bandidos fortemente armados, em uma chácara do município de Várzea Paulista, ao massacre de prisioneiros políticos indefesos da ditadura militar.

 

Decretou que o senso de justiça da bandidagem, no caso de Várzea Paulista, estaria acima daqueles da PM e do próprio governo do Estado. Isto porque um tribunal do crime, que na chácara se instalara, “absolvera” de forma generosa um dos presentes –acusado de estupro, depois morto na operação policial.

 

Por fim, Maria Rita classificou como sendo retórica ditatorial uma declaração do governador Geraldo Alckmin (“Quem não reagiu está vivo”) e despejou sobre os leitores números que pudessem dar verossimilhança a seu diagnóstico.

 

O texto é delirante, perverso e desequilibrado. A psicanalista demonstrou desconhecer segurança pública; desprezar fatos e estatísticas; e menosprezar a memória e o trabalho de várias pessoas que, embora não partilhem de sua cartilha, contribuíram para a redemocratização no país.

 

O Governo do Estado de São Paulo não tolera abuso oficial.

 

Desde 2000, 3.999 policiais militares e 1.795 policiais civis foram demitidos por má conduta no Estado (dados até 18 setembro deste ano). Só na atual gestão, foram 392 policiais militares e 252 policiais civis.

 

Ao mesmo tempo, e sem qualquer contradição entre os dois esforços, a Polícia Militar impediu, e vai continuar a fazê-lo, que o crime se organize e realize julgamentos ao arrepio do Estado democrático de Direito.

 

Aqui, o crime não instala tribunal; aqui, o crime não ocupará funções privativas do Estado; aqui, o crime não vai dialogar com os Poderes constituídos.

 

A declaração do governador que tanto ouriçou a psicanalista Maria Rita foi feita dentro de um contexto de apuração e controle. Ele não se omitiu em relação à necessidade de investigar o que ocorreu.

 

Ao contrário. Disse ele, na mesma ocasião: “Olha, quando há resistência seguida de morte: investigação. A própria Polícia Militar investiga e o DHPP, que é o Departamento de Homicídios, também investiga”¦ A investigação pela Corregedoria já era de praxe. O que é que nós colocamos a mais? O DHPP. Ele faz a investigação em todos esses casos, ele conduz a investigação.”

 

E o que isto significa? Que o Estado de São Paulo foi o primeiro a colocar um corpo de elite da Polícia Civil –no caso, o DHPP– para apurar resistências seguidas de morte. Nas demais unidades da Federação (algumas das quais querem adotar o modelo paulista), as resistências não são apuradas, muito menos comandadas, por departamentos qualificados.

 

MENTE FANTASIOSA

 

A medida fortaleceu o eficaz sistema de freios e contrapesos, típico dos regimes democráticos. Apenas na mente fantasiosa de Maria Rita Kehl os experientes delegados do Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa, da Polícia Civil, deixarão de cumprir sua obrigação para encobrir eventuais desvios de conduta de policiais militares.

 

A retórica inflamada e irresponsável desta senhora não fará o governo mudar o rumo na segurança pública. Rumo este, aliás, iniciado na década de 90, com a criação da Ouvidoria da Polícia, com a instituição da disciplina de direitos humanos no curso das polícias e com o combate à letalidade. E que vem sendo seguido pelo atual secretário, Antonio Ferreira Pinto, notoriamente comprometido com o rigor e com a legalidade.

 

Segundo os dados do último anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública do Ministério da Justiça (2011), a letalidade da polícia paulista é menor do que a de outros Estados do Brasil, tanto em números absolutos como nas taxas por 100 mil habitantes.

 

Em 2010, morreram 510 pessoas em confronto com a polícia paulista, uma taxa de 1,2 mortos por 100 mil habitantes. No Rio de Janeiro, que tem pouco mais de um terço da população de São Paulo, foram mortas 855 pessoas em confronto policial (taxa de 5,3 por 100 mil habitantes). Na Bahia, a taxa é de 2,2 por 100 mil. Como se vê, a fantasia baseada em distorções ideológicas não se sustenta quando confrontada com dados.

 

Maria Rita Kehl retrata a Polícia Militar de São Paulo como assassina contumaz de jovens. Pois São Paulo foi o Estado brasileiro que mais reduziu a taxa de homicídio de crianças e adolescentes (até 19 anos) por 100 mil habitantes entre 2000 e 2010, segundo o Mapa da Violência do Instituto Sangari: queda de 76,1%, de 22,3 para 5,4.

 

Também em números absolutos, o Estado de São Paulo teve a maior queda nesse índice entre 2000 e 2010. A redução foi de 2.991 homicídios de jovens e adolescentes, registrados em 2000, para 651 em 2010.

 

E o que aconteceu no Brasil no período? O número absoluto de homicídios de crianças e adolescentes cresceu 6,8%, entre 2000 e 2010 (de 8.132 para 8.686 casos) e a taxa por 100 mil habitantes subiu de 11,9, em 2000, para 13,8 em 2010.

 

DISTORÇÕES

 

Mas números não bastam para esta senhora. A distorção moral e ética de seu pensamento é insanável. Para Maria Rita, uma luta justa deveria contar sempre com mortos também entre policiais militares. Para ela, a profissionalização da Polícia Militar, treinada também para evitar baixas, é uma disfunção, um defeito, uma evidência de covardia.

 

Entende-se: entre a polícia e os bandidos, parece que ela já fez a sua escolha. Maria Rita acha que uma luta justa entre Polícia e bandido tem de terminar em empate –quiçá com a vitória da bandidagem, que ela deve confundir, em sua leitura perturbada da realidade, com uma variante da luta por justiça.

 

A Polícia Militar salva vidas, Maria Rita. É treinada para proteger a população do Estado. Atendeu a mais de 43 milhões de chamados em 2011. Realizou 310 mil resgates e remoções de feridos. Efetuou 128 mil prisões. A PM de São Paulo está entre as melhores do país.

 

Por isso, o Estado de São Paulo, segundo o Mapa da Violência, está em penúltimo lugar no ranking dos homicídios por 100 mil habitantes. A capital paulista é aquela em que, hoje, menos se mata no país, segundo o mesmo estudo.

 

Estivesse ela interessada em debater de fato o problema da Segurança Pública, Maria Rita tentaria entender a relação entre drogas e o crime organizado, como aquele instalado na chácara de Várzea Paulista. E por que o Brasil é o primeiro mercado consumidor mundial de crack e o segundo de cocaína? Nunca é suficiente repetir que o Estado de São Paulo produz laranja, cana, soja. Mas não produz folha de coca. Como ela entra no país? E as armas?

 

Mas estas não são as preocupações de Maria Rita. Ela quer confundir. Por isso até misturou o caso de Várzea Paulista à desocupação judicial da área conhecida como Pinheirinho, onde não houve vítima fatal e criou-se, bem ao seu estilo, um episódio mentiroso para fazer luta partidária.

 

A obrigação da autoridade pública é enfrentar o problema, seja ele a bandidagem comum ou a bandidagem da polícia. Se houve abusos, eles serão punidos após a investigação, como sempre o foram, e não antes.

 

Maria Rita Kehl, aliás, tornou-se partidária do julgamento extrajudicial. Ela não conhece detalhes da ação da polícia, mas já expediu a sua sentença condenatória, mimetizando, ela sim, os métodos das tiranias. Com uma diferença. As ditaduras criavam simulacros de julgamento. Precisavam convencer a si mesmas de sua farsa. Maria Rita não precisa ser nem parecer justa.

 

Ela deveria se envergonhar –mas não se conte com isso, pois está cumprindo uma agenda partidária –como, aliás, já havia feito nas eleições de 2010. Desmoralizar a polícia de São Paulo é parte de um projeto de poder.

 

O Governo do Estado de São Paulo não tem compromisso com o crime.